São Paulo, domingo, 3 de março de 1996
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Exclusão coloca em risco a democracia

ANTONIO PRADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A inexorabilidade do desemprego tecnológico e sua intensidade estão condicionadas por fatores de natureza macroeconômica e institucional. Não há uma determinação mecânica entre a adoção de inovações técnicas e organizacionais e a queda generalizada na geração de empregos.
Se é verdade que a difusão de um novo paradigma tecnológico provoca desemprego setorial, mudando a composição e a qualidade dos empregos, não é necessariamente verdade que esse desemprego se difunde por todo o mercado de trabalho a partir da sua adoção.
Excessos liberais
É útil ressaltar que existem economias que produziram taxas sustentadas de crescimento da produtividade do trabalho, como é o caso da japonesa, a partir de um processo intenso de mudança tecnológica, e que foram capazes de manter o pleno emprego.
No entanto, é inegável que, se esses países souberam defender o emprego em suas fronteiras, a partir de uma bem-sucedida política de planejamento econômico e industrial, o aumento de sua participação nos mercados internacionais produziu desemprego em vários deles, principalmente entre os que adotaram políticas comerciais excessivamente liberais.
Mas a difusão das novas tecnologias em países absorvidos pela hegemonia de políticas econômicas baseadas no Consenso de Washington, principalmente nos subdesenvolvidos (como Brasil, Argentina e México), sem dúvida, tem acarretado uma queda acentuada do emprego industrial e em segmentos dos setores de serviços.
Nesses casos, a combinação de liberalização comercial com rápida queda das tarifas aduaneiras, a sobrevalorização cambial utilizada para sustentar políticas de estabilização e a ausência de políticas industriais tem se revelado explosiva e fator de criação de novas formas de desemprego que se agregam às previamente existentes, aprofundando a exclusão social.
"Novo desemprego" O enfraquecimento ou a ausência de mecanismos institucionais para a distribuição dos ganhos de produtividade e a defesa do emprego realimentam esse circuito.
As facilidades para a dispensa imotivada, a manutenção de jornadas de trabalho elevadas, o uso indiscriminado de horas extras diminuem a capacidade de absorção de mão-de-obra. Por outro lado, a não-incorporação dos ganhos de produtividade aos salários enfraquece o crescimento do mercado interno.
Dessa forma, o desemprego permanece elevado e tende a crescer, gerando um "novo desemprego", causado por mudanças estruturais orientadas por políticas conservadoras. Evitar essa tendência é fundamental, sob o risco de se colocar a própria democracia em questão. Sociedades com milhões de desempregados, candidatos a se tornarem excluídos, são tudo, menos estáveis.

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