São Paulo, domingo, 17 de março de 1996
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Lições da truculência

LUCIANO COUTINHO

Nos Estados Unidos os mercados de valores mobiliários exibiram grande volatilidade nas últimas duas semanas. As taxas de juros de longo prazo (i.e. títulos de 30 anos do Tesouro americano) subiram apreciavelmente (de pouco mais de 6% ao ano para mais de 6,7%), provocando impactos imediatos sobre as taxas de juros de todos os papéis longos no mundo inteiro.
Para o Brasil, que precisa financiar um déficit em conta corrente próximo a 3% do PIB, por meio da absorção de recursos externos, isso pode significar um apreciável aumento do "custo" dos recursos em moeda estrangeira.
A instabilidade vem da excessiva valorização da Bolsa de Valores dos EUA. O índice Dow Jones subiu cerca de 45% nos últimos 15 meses, após quatro anos consecutivos de bons resultados.
O mercado avalia que chegou a hora da reversão e olha com grande ansiedade para a decisão que o Federal Reserve norte-americano tomará no próximo dia 26, a respeito da taxa de juros de curto prazo.
Em dezembro e janeiro passados, o Fed reduziu as taxas (de 5,75% para 5,25%), em face da desaceleração do crescimento e da inflação reduzida, e isso excitou mais a Bolsa.
A expectativa era de mais um corte em março, agora colocado em dúvida por sinais preliminares de maior vitalidade da economia americana. A frustração desse corte adicional pode deflagrar uma "correção" baixista da Bolsa, com forte volatilidade e mais pressões altistas sobre os juros de longo prazo.
Felizmente não existe, ainda, o risco de um aperto monetário global. Na Europa, a tendência dos juros é de queda, face às pressões políticas resultantes do desemprego.
O Japão -cuja taxa de juros é mínima, de 0,5% ao ano- não deve subi-la por enquanto, pois o seu sistema bancário enfrenta séria inadimplência.
Muito embora não exista em 1996 o risco de restrições aos fluxos de financiamento, o episódio recente encerra lições que devem ser ponderadas.
Quando a economia mundial começar a crescer sincronizadamente, ao longo de 1997, as taxas de juros poderão subir outra vez, tornando crescentemente escasso o financiamento para os "mercados emergentes".
Nessa circunstância, todos os países que dependerem de elevado volume de recursos externos estarão em palpos de aranha. O Brasil ainda tem algum tempo para ajustar sua combinação câmbio-juros e reduzir a vulnerabilidade. Se não o fizer, poderá pagar muito caro mais tarde.

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