São Paulo, domingo, 17 de março de 1996
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Taiwan vota e desafia cultura chinesa

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

Taiwan, ao realizar no sábado as primeiras eleições presidenciais diretas de sua história, desafia a tese de que sociedades chinesas e democracia não se misturam e assusta a China.
Seu poderoso vizinho lançou exercícios militares e mergulhou a região numa tensão não vista desde os anos 50.
A China comunista teme que a votação em Taiwan endosse a idéia de formalizar a separação, ocorrida em 1949.
Naquele ano, comunistas venceram a guerra civil e os nacionalistas se refugiaram em Taiwan.
Vencedores e vencidos, ainda que separados pela ideologia, prometem buscar a reunificação. Mas a China teme que neste final de século Taiwan, embalada por seu sucesso econômico, desista de voltar à "pátria-mãe".
Exercícios militares
O governo de Pequim iniciou no dia 8 de março exercícios militares que carregam uma mensagem política. Ele quer que Taiwan acelere processo de reunificação.
A China espera que sua mobilização militar -exercícios a poucos quilômetros do território controlado pelos nacionalista- assuste eleitores de Taiwan e os leve a votar num candidato dócil às exigências do governo de Pequim.
Mas o favorito nas eleições, Lee Teng-hui, atual presidente, é arqui-rival de Pequim. Ele quer ser o primeiro presidente democraticamente eleito em 5.000 anos de história chinesa.
Lee Teng-hui calcula que, com vitória nas urnas, ganhará mais apoio, tanto interno como internacional, para desafiar o governo comunista.
Democratização
A democratização de Taiwan lança uma luz sobre a ditadura que ainda impera na China.
Em 1988, Lee Teng-hui chegou ao poder por meio de eleições indiretas e promoveu abertura política numa ilha que vivia na escuridão da ditadura do Kuomintang, o partido dos nacionalistas chineses. Lee pertence ao Kuomintang.
Enquanto a ortodoxia maoísta asfixiava a economia da China, Taiwan aperfeiçoava um modelo capitalista apoiado na industrialização e exportação.
Cingapura, Hong Kong e Coréia do Sul, outros países da região, seguiam trilha semelhante e ganharam o apelido de "tigres asiáticos".
Os "tigres asiáticos" acenavam com o autoritarismo político como um ingrediente indispensável para se alcançar o desenvolvimento. Mas a aparição de uma classe média, aumento do nível educacional e melhor organização da sociedade civil trouxeram reivindicações de democratização.
Taiwan passou a ser um dos símbolos do cadenciado avanço oriental rumo à democracia.
Relações exteriores
O tema principal da campanha são as relações com a China. O governo comunista deslanchou exercícios militares que terminam apenas no dia 25 e incluíram disparos de mísseis e uso de munição como em situação real de guerra.
A China quer evitar um triunfo de Lee Teng-hui, pois o acusa de levar Taiwan ao caminho da independência, ou seja, renunciar ao objetivo da reunificação.
Pequim já disse que invade Taiwan caso a ilha declare independência. Lee Teng-hui nega a opção independentista. Mas condiciona a reunificação à democratização da China.
Enquanto a democracia não chega à China, Lee Teng-hui busca aumentar a presença internacional de Taiwan.
Ele quer, por exemplo, recuperar a cadeira na ONU (Organização das Nações Unidas), perdida em 1971, quando o regime de Pequim ganhou reconhecimento internacional.
Taiwan mantém relações diplomáticas com apenas 31 países. A China busca impor um isolamento diplomático e exige de seus parceiros que tenham apenas laços não-oficiais com a "ilha rebelde", ou seja, vínculos econômicos e culturais.

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