São Paulo, sábado, 23 de março de 1996
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Passe a passe

JUCA KFOURI

A mudança na Lei do Passe proposta pelo Ministério dos Esportes é um avanço. E certamente tem seus méritos, tanto que está sendo criticada pelo sindicato dos atletas e pela cartolagem dos clubes. Se é verdade que a virtude está no meio, eis aí uma eventual prova da correção da proposta.
O curioso é que o próprio Pelé defende uma idéia mais radical. Ele concorda com o presidente do sindicato paulista, Martorelli, e gostaria da extinção pura e simples do passe.
Não pensa assim, no entanto, a maioria do conselho do ministério que, aliás, teve o bom senso de trazer sua proposta por escrito à discussão pública.
Os cartolas esperneiam com um argumento conhecido: o fim do passe desestimularia o investimento na formação de jogadores.
Pensemos juntos. No estado ideal, sem nenhuma forma de Lei do Passe que não seja a simples consagração do direito de ir e vir -de trabalhar para quem o empregado quiser-, um clube investe nas categoria de base e descobre talentos. Pega esses talentos, faz contratos profissionais com eles, paga o que merecem e os mantém vinculados. Surge um outro clube e tenta levá-los oferecendo um contrato melhor.
Ora, em primeiro lugar, o clube que tem o talento sob contrato terá direito de mantê-lo até que o contrato termine ou, então, terá direito a ser indenizado pelo rompimento. Em segundo lugar, se o clube que investiu na descoberta do talento quiser mantê-lo, bastará fazer uma proposta mais interessante e até renovar o contrato ainda vigente.
Mais: certamente será um grande negócio investir nas categorias de base, fazer contratos com quem valer a pena e, depois, passar adiante recebendo indenizações tão grandes como os valores atuais nas transações.
Agora, se o clube que investiu não acha que o talento que descobriu vale tanto a ponto de querer mantê-lo, que o deixe ir embora tratar de sua vida quando o contrato acabar.
É disso que se trata, apenas disso, nada mais. Razão pela qual, mesmo diante do reconhecimento de que a proposta em discussão é um avanço inegável e admitindo que certas conquistas são mesmo graduais, passo a passo, a coluna fica ao lado dos que querem o fim da escravidão, sem mais.
Em vez da Lei dos Sexagenários, é hora da Lei Áurea, apesar do injustificável silêncio dos principais interessados, os jogadores.

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