São Paulo, sábado, 23 de março de 1996
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Stewart desvenda a 'des-medéia' Stoklos

DA REDAÇÃO

Aos 70 anos, Ellen Stewart é uma das personagens mais respeitadas do teatro de vanguarda mundial. Há 35 anos ela fundou e até hoje comanda o Teatro La Mama ETC, em Nova York, pelo qual já passaram nada menos do que 1.800 produções de todo o mundo.
Foi no palco do velho edifício do East Village que alguns dos diretores mais influentes deste século fizeram seu début nos Estados Unidos, entre eles Jerzy Grotowski, Ryxzard Cleaslak e Tadeuz Kantor.
Stewart foi também a responsável pelo lançamento nos EUA da atriz e dramaturga brasileira Denise Stoklos. A seguir, a conversa que elas tiveram em Nova York, durante a temporada local de "Des-Medéia", espetáculo de Stoklos que reestréia hoje em São Paulo:
*
Ellen Stewart - No ano que vem o La Mama faz 35 anos e você, dez anos de apresentações neste teatro. Qual é a única pergunta que te faço sempre, todas as vezes?
Denise Stoklos - "O que você está precisando para sua peça?"
Stewart - Não tenho o hábito de perguntar nada, o porque ou o que ela quer trazer para cá. É confiança desde a primeira vista.
Stoklos - É a relação ideal de criador com produtor. Foi no Uruguai que isto começou, no Festival de 1986 em que a Ellen participava e eu me apresentava com um monólogo. O Antonio Abujamra ficou insistindo que eu dissesse a ela para me trazer a Nova York.
Stewart - Eu fui em seguida para São Paulo e lá formalizei o convite.
Stoklos - Formalizou assim: venha, em tais condições. Eu disse: então me mande o contrato. Ela respondeu que o contrato comigo já estava assinado: pegou minha mão e me abraçou. Intuição pura.
Stewart - (Ri) Mas não acerto? Não te disse que "Des-Medéia" iria funcionar aqui em português?
Stoklos - É, eu já estava arrependida de ter sugerido que este ano eu me apresentasse na sala maior, o Annex. Todo ano venho me apresentando no First Floor Theatre (sala menor) em inglês, em ótimas temporadas. O Annex tem uma relação com o sindicato dos atores de Nova York que permite a atores estrangeiros se apresentarem apenas no idioma de origem. Retrabalhei o espetáculo e o trabalho corporal ficou um pouco mais à frente, o vocal mais musical. O resultado foi muito melhor do que esperava. Ganhei receptividade de público e crítica -foi indicado com espetáculo da semana pelo "Village Voice" e pelo "New York Times".
Stewart - Você está aqui desde dezembro. São três meses de estadia sua na residência do La Mama.
Stoklos - Acho maravilhoso viver num loft localizado literalmente em cima de um teatro. Nos corredores se vêem os parafusos dos urdimentos, pelas frestas ouve-se a sonoplastia dos espetáculos.
Stewart - Você pede sempre o andar maior do nosso prédio de ensaios e fica lá o dia inteiro.
Stoklos - Todas as minhas peças nestes últimos dez anos têm sido criadas lá. Gosto do espação lá dentro, a neve lá fora, o saudável distanciamento temporário do meu país.
A distância liberta o ser de referências que às vezes podem regionalizar, provocar uma auto-referência gasta.
Stewart - Movimento é uma constante sua, em todos os aspectos.
Stoklos - Eu nasci e comecei a fazer teatro em Irati, interior do Paraná, depois fui fazer universidade em Curitiba. Foi o primeiro distanciamento que já produziu em mim um olhar crítico sobre meu "environment" inicial.
Mais tarde aconteceu o mesmo processo com minha mudança de Curitiba para São Paulo, para desenvolver minha vida profissional como atriz.
Já com várias experiências no meio teatral paulista, fui para Londres, onde vivi três anos. E nunca mais parei de conviver com o mundo, pelo contrário, só intensifiquei.
Já são 31 países onde me apresentei. Em informação confirmada pelo professor Sábato Magaldi, o repertório de minha companhia, o Teatro Essencial, é o teatro brasileiro que mais se apresentou no mundo até hoje.

Peça: Des-medéia, adaptação de Eurípides
Direção, texto e interpretação: Denise Stoklos
Quando: estréia hoje, às 21h
Onde: Teatro João Caetano (r. Borges Lagoa, 650, tel. 011/573-3774).
Ingresso: R$ 8

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