São Paulo, sábado, 30 de março de 1996
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Tognazzi retrata fanatismo no futebol

DANIELA ROCHA
EDITORA-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

Uma mostra de cinema italiano que já passou por Nova York, Berlim e São Petersburgo chega a Santos (72 km a sudeste de SP).
Na segunda-feira, o clássico do neo-realismo "Onde está a Liberdade...?", de Roberto Rosselini, abre o festival, com exibição a céu aberto em telão montado na praia do Boqueirão.
Até o dia 7, outros 12 filmes de novos cineastas da Itália serão exibidos em dois cinemas da cidade, Iporanga e Indaiá.
Organizada pela prefeitura de Roma e trazida ao Brasil pela prefeitura de Santos, a Mostra de Cinema Italiano inclui workshops com o cineasta Rick Tognazzi, a roteirista Simona Rizzo (ambos do filme "Ultrà" ou "Os Fanáticos") e a atriz Gina Lollobrigida. Também confirmaram presença os diretores brasileiros Ugo Giorgetti e André Klotzel.
Entre os filmes de destaque da mostra estão "Mery para Sempre", de Aurelio Grimaldi, com a história de meninos que vivem em um presídio em Palermo, e "Ultrà", de Rick Tognazzi, 40, que venceu o Urso de Prata no Festival Internacional de Berlim.
Em entrevista por telefone de sua casa, em Milão, Tognazzi (filho do ator Ugo Tognazzi) fala sobre seu filme, sua carreia e sua afinidade com o futebol e o Brasil.
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Folha - Do que trata "Ultrà"?
Rick Tognazzi - A história é sobre um grupo de torcedores de futebol que toma um trem de Roma a Turim para ver um jogo. É a história da relação dessa gangue. O filme foi feito em 91. Muito do comportamento dos jovens mudou em termos de intenção e moda. Mas a relação dentro do grupo é a mesma, comparada àquela época, e o fanatismo também.
Folha - O que o levou a fazer um filme sobre fanatismo no futebol?
Tognazzi - É um fenômeno muito forte não apenas aqui na Itália, mas em países onde o futebol é popular. O filme também faz uma metáfora sobre a vida, o amadurecimento, a procura da identidade, com meninos entre 16 e 20 anos.
Folha - O sr. considera o seu trabalho jornalístico, no sentido de registrar no cinema o que se passa no cotidiano das pessoas?
Tognazzi - Há três filmes que são sobre a realidade. É uma trilogia sobre diferentes tipos de violência. O primeiro, "La Scorta", é sobre guardas que escoltam criminosos em uma corte; o segundo, "Ultrà", é sobre fanatismo no futebol, e o terceiro, "Vite Strozzate", é a história de pessoas que cometem extorsão, outro fenômeno que explodiu no último ano na Itália. São filmes baseados na realidade, mas são obras de ficção.
Folha - Seu próximo filme também segue essa linha?
Tognazzi - Cada filme que faço tem um longo período de pesquisa. No próximo, devo fazer uma comédia sobre pequenos dramas no universo de dois jovens de 16-18 anos, que marcam um encontro em um estádio de futebol hoje, exatamente um ano depois de terem se visto na mesma situação. São pequenas histórias sobre o destino desses jovens, como numa peça teatral.
Folha - Também toca no tema futebol. Foi por acaso?
Tognazzi - Sim, são dois filmes diferentes. Mas gosto muito do universo do futebol.
Folha - O sr. torce para que time?
Tognazzi - Para o Milan.
Folha - O sr. nasceu em Milão.
Tognazzi - Sim. Meu pai já torcia para o Milan, meu irmão e irmã também. É algo genético. Minha mulher é torcedora do Roma. Temos discussões quentes nas noites de sábado e manhãs de domingo.
Folha - O sr. filmou "Ultrà" em estádios com os torcedores?
Tognazzi - Nesse filme, fiz uma pesquisa gravando entrevistas em vídeo com centenas de torcedores. O roteiro foi baseado nessa documentação. Ao mesmo tempo, alguns daqueles garotos foram selecionados para participar do filme. É uma mistura de atores profissionais e torcedores. Alguns deles viraram atores devido ao sucesso na Europa no seu lançamento.
Folha - Como o público reagiu?
Tognazzi - Não é muito fácil "vender" uma história sobre fanatismo, principalmente ligado ao futebol. "Ultrà" é um pequeno filme com uma pequena distribuição. Ainda assim, teve uma reação muito positiva na Itália, Inglaterra, Espanha e outros países.
Folha - O sr. assistiu a "Kids" e "O Ódio", filmes que tratam também de adolescência e violência?
Tognazzi - Não vi "Kids". Li sobre "O Ódio" e concordo que há semelhanças com "Ultrà".
Folha - Qual sua opinião sobre o cinema americano?
Tognazzi - Adoro o cinema americano, mas Hollywood restringe nosso mercado. A língua ainda é uma barreira. Somos colonizados por Hollywood.
Folha - O sr. já veio ao Brasil?
Tognazzi - Não, mas tenho a impressão de que estou indo visitar um primo que nunca vi, mas com quem sempre conversei. Por causa da música, do futebol, das contradições do país, que lembram tanto a Itália.
Folha - Existe algum time de futebol brasileiro que o sr. gosta?
Tognazzi - Juro que não é lobby com a cidade, mas torço para o Santos. Quando era criança, Pelé era um garoto como eu. Santos ainda vai bem?
Folha - No ano passado, o time foi vice-campeão brasileiro.

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