São Paulo, quarta-feira, 3 de abril de 1996 |
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As mutações na sociedade e a reforma tributária
VALDIR CAMPOS COSTA O acordo fechado entre metalúrgicos de São Paulo e o grupo G-3 da Fiesp para adoção de contratos de trabalho temporário deve trazer lições a todos os setores envolvidos na questão.Entre os sindicalistas, é preciso observar uma nova realidade. O fechamento de postos de trabalho não é um simples indício de crise ou recessão, como tentam pichar alguns pessimistas de plantão. O país está passando pela reestruturação econômica que o Plano Real exige para sua efetivação. Portanto, a intransigência não pode obstruir as negociações que permitam a geração de novos empregos, com ajustes do mercado. Ao minimizar os encargos sociais embutidos na folha de pagamento, metalúrgicos e empresários deixaram muito evidente o significado da carga tributária na relação capital-trabalho. Naturalmente, houve uma compreensão por boa parte das autoridades de Brasília, que já cogitaram flexibilizar as leis trabalhistas, com o objetivo de abrir caminho para a extensão dessas novas diretrizes empregatícias. Vão enfrentar os juízes, que já advertiram: o trabalhador que se sentir prejudicado não terá dificuldade em obter nos tribunais aquilo que foi suprimido do acordo. Na verdade, o que existe neste momento é uma grande expectativa em torno de uma experiência que se inicia. É preciso destacar a urgência da reforma tributária. Fernando Henrique entra em seu segundo ano de governo apresentando mais virtudes do que decepções. Mas o presidente e seus imediatos precisam elevar a reformulação do sistema tributário nacional à condição de prioridade, ao lado das reformas previdenciária, administrativa e até da reeleição. O que nos causa desalento é o fato de a emenda elaborada pelo governo estar em poder dos parlamentares há pelo menos sete meses, sem que nenhum segmento da esfera oficial tenha se manifestado em relação à necessidade de promover um amplo debate a respeito das propostas. Em poder da proposta de reforma tributária do governo federal, entidades representativas de empresários e trabalhadores mantêm reuniões periódicas para debater pontos que julgam controvertidos. PNBE, Associação Comercial de São Paulo, Fiesp, CUT, Força Sindical, Sociedade Rural Brasileira, Secovi, Fenabrave e Febraban buscam as melhores opções, respeitando os "parceiros" e "futuros signatários" de um projeto final. A proposta do governo gera algumas controvérsias. Primeira: a devolução de saldo credor do ICMS das empresas ocorrerá quando e como o governo quiser. Segunda: para o recolhimento do ICMS federal, cada integrante da cadeia, do produtor ao comerciante final, terá que preencher guias, com obrigação de fazer o cálculo do percentual que cabe ao Estado e da fatia destinada à União. Nesse caso está o contraposto do combate à sonegação, que pode ocorrer de forma involuntária, devido à complexidade do procedimento. Terceira: o governo obrigará as pessoas jurídicas a fazer o recolhimento de Imposto de Renda antecipadamente, mesmo que no período de referência elas tenham registrado prejuízo. E, sobre a sonegação, o Executivo pretende atribuir à Receita Federal poderes que ameaçam os contribuintes com a possibilidade de exagero por parte dos fiscais. Uma das propostas permite que a Receita peça a quebra do sigilo bancário quando bem entender. Nesse ponto, o Brasil poderia aproveitar exemplos de outras nações. Nova Zelândia, Dinamarca, Cingapura e Finlândia são os países com menor índice de sonegação. Para prever esse tipo de crime, eles obrigam as empresas a fazer auditoria regularmente. O mesmo ocorre na Alemanha, no Japão, na França etc. Arbitrariedade também está presente no projeto. A União quer ter o direito de criar e cobrar impostos num mesmo exercício. Os empréstimos compulsórios seriam criados através de lei ordinária, sem abrir brechas para contestação. O ouro é um ativo financeiro, cujo Imposto sobre Operação de Crédito passaria a ser destinado exclusivamente ao governo federal. O Imposto sobre Transmissão de Bens Móveis e Imóveis (ITBI) incidirá sobre incorporações, justamente quando a ordem é buscar fusões para enfrentar a chamada globalização. Outro dilema: a guerra fiscal entre Estados. O próprio relator da comissão especial da reforma tributária é a favor da disputa entre os governos regionais, muitas vezes em detrimento de seus próprios orçamentos. Empresas que procuram sede para novas instalações se beneficiam de generosos descontos e prazos de recolhimento dilatados. Enfim, é preciso advertir o governo de que a reforma tributária envolve interesses mais amplos. Com ela, será possível abrir novos caminhos, como aquele que começa a ser trilhado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e pelo grupo G-3 da Fiesp. Com menor carga de impostos, taxas e contribuições, as empresas poderão gerar empregos e haverá menor estímulo à sonegação. Reestruturar a Previdência é fundamental. Conter despesas com pessoal é imprescindível. Mas menosprezar a urgência da reforma tributária é um grave erro. 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