São Paulo, quarta-feira, 3 de abril de 1996
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Mostra homenageia mecenas Diaghilev em Londres

Galeria conta vida do criador dos Ballets Russes

IGOR GIELOW
DE LONDRES

A vida de um dos criadores da arte moderna como evento é alvo de uma grande exposição que termina dia 14 na Barbican Art Gallery, em Londres. Pela primeira vez, uma mostra recupera os detalhes que circundaram a formação de Sergei Pavlovich Diaghilev, nascido em 1872 na Rússia czarista.
Diaghilev sintetizou, em cerca de 30 anos, o espírito da arte moderna. Antagonismo, revisão de conceitos e, principalmente, atitude agressiva. E ele nunca foi artista.
"Sou, em primeiro lugar, um grande charlatão (...) Mas acho que achei minha real vocação: ser um mecenas", escreveu Diaghilev à sua madrasta em 1895.
Naquele ano, já havia passado pela faculdade de direito de São Petersburgo, conhecido a Europa Ocidental, assumido sua homossexualidade e seu primeiro amante, o primo Dimitri Filosofov.
Homossexualismo
A exposição erra ao esconder a face homossexual de Diaghilev. Ele a usava não para militar ou fazer apologias, e sim para chocar.
O erotismo, em especial o considerado heterodoxo, era a forma com que artistas entre 1900 e 1920, como o pintor Gustav Klimt e o escritor Oscar Wilde, revestiam sua arte para causar impacto.
Os primeiros anos de militância artística de Diaghilev e seus amigos, em especial depois do lançamento da revista "Mundo da Arte" em 1898, são descritos com cartas, obras de arte e fotografias.
Na sequência, é destrinchado o papel de Diaghilev como uma espécie de aglutinador da arte russa.
Ele organizou, em paralelo às suas mostras de arte ocidental, a maior exposição de arte feita até então na Rússia. Em 1905, levou 40 mil pessoas ao palácio de Tauride, em São Petesburgo, em seis meses.
Motivado pelo sucesso de sua mostra no Tauride, levou em 1906 e 1907 suas exposições a Paris.
Balé Começou a fomentar na França, com amigos como Jean Cocteau, a idéia de fundir suas experiências com música e artes plásticas em uma única forma: o balé. É a origem dos Ballets Russes, motores do balé moderno.
Diaghilev ainda leva o mérito de ter abraçado em sua companhia dois revolucionários em suas artes: o compositor Igor Stravinsky e o bailarino Vaslav Nijinsky.
A exposição no Barbican Centre tem seu auge na descrição da composição de peças como "O Pássaro de Fogo" e "Petrushka". Figurinos, partes de cenário e croquis compõem a mostra.
Frustração
Paradoxalmente, é nesse ponto que ela frustra o visitante.
Em 29 de maio de 1913, estreou no recém-inaugurado Théâtre de Champs-Élysées, em Paris, "A Sagração da Primavera".
Obra de Stravinsky com coreografia de Nijinsky, o balé marca o nascimento do acontecimento cultural conforme nós o conhecemos hoje: reações iradas da platéia, inconformada com os passos matemáticos do corpo de baile, críticas nos jornais ridicularizando a cacofonia da música.
Segundo observa o historiador canadense Modris Ekstein, a repercussão de "Sagração" deu os parâmetros para o moderno empresariado da arte -o do risco calculado, porém sempre risco.
A exposição no Barbican omite isso. "Sagração" é resumida a três pequenos quadros com figurinos usados pelos bailarinos.
Sua produção entre 1918 e 1929, ano de sua morte, também é perdida. O que não é um problema maior: a essência de sua obra, ou ainda, de sua capacidade de lançar obras alheias, está presente.

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