São Paulo, quinta-feira, 4 de abril de 1996
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DIREITO PENAL

A quase surreal rebelião de Goiás que tomou como refém toda a cúpula do Judiciário estadual e a série de revoltas nas cadeias argentinas são o exemplo vivo e acabado de que há algo de errado com o sistema penal baseado em penas de prisão.
Há muito esta Folha defende que esse tipo de pena seja reservado unicamente a criminosos que representem uma ameaça física à sociedade. Nesse sentido, uma reforma na legislação com vistas a ampliar as chamadas penas alternativas -como a prestação de serviços à comunidade, as multas e a restrição de direitos- seria mais do que bem-vinda.
Mas, como bem lembrou o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Sepúlveda Pertence, em recente participação no 2º Seminário Internacional sobre Independência Judicial na América Latina, este não é o momento adequado para dar curso a uma ampla reforma legislativa.
Para o ministro, a opinião pública, insuflada por campanhas "primárias" que pedem mais prisão, poderia pressionar o Congresso a ampliar ainda mais esse tipo de pena, o que só agravaria os problemas existentes.
De fato, os terríveis índices de violência registrados no país criam um caldo de cultura que permite que alguns, talvez tentando projetar-se politicamente, lancem campanhas pedindo mais e mais prisões quando não a hedionda pena de morte. Infelizmente, suas pregações encontram eco numa sociedade cotidianamente massacrada pela violência.
Para proceder à tão necessária reforma na legislação penal será preciso aguardar até que a sociedade se convença de que justiça não é vingança e de que, quando se coloca um pequeno infrator ao lado de um perigoso bandido, aí sim corre-se o risco de torná-lo uma ameaça concreta.
O realismo e a responsabilidade de Pertence, a autoridade máxima da Justiça do país, são uma amostra de que o Poder Judiciário brasileiro ainda pode avançar muito.

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