São Paulo, sexta-feira, 5 de abril de 1996
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Chabrol observa agonia da razão francesa

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

Claude Chabrol trabalha como um eterno aprendiz: aquele que, filme após filme, coloca todo empenho em descobrir e dominar os segredos de sua arte.
O aprendiz é modesto, busca a atualidade. E nada pode ser mais atual do que "Mulheres Diabólicas", se observado apenas seu conteúdo. Uma família burguesa contrata uma empregada (Sandrine Bonnaire). A família é simpaticíssima. A moça é competente e agradável.
No entanto, bastam um pequeno incidente (a descoberta de que ela não sabe ler) e a amizade com uma moça intrigante (Isabelle Huppert) para o idílio se transformar em um pesadelo.
Nos últimos anos, o cinema francês tem dado sinais de vitalidade, com filmes como "Bye Bye", de Karin Dridi, ou "O Ódio", de Matthieu Kassowitz, colados à observação da vida real.
O que observam não é agradável. Inclui as contradições entre pobres e ricos, franceses e imigrantes: fraturas brutais na sociedade e cultura européias atuais.
Chabrol não foge dessa raia. Observa o fenômeno do ódio social do ponto de vista dos burgueses. Não se trata de defendê-los. Seu empenho é em mostrar como a irracionalidade infiltra-se numa cultura construída sobre a razão.
Como pode a irracionalidade melhor triunfar, senão sob a forma do policial? É isso que Chabrol faz, afirmando-se (de novo) como o grande herdeiro de Fritz Lang.
Isto é, "Mulheres Diabólicas" tanto descreve o funcionamento de um mecanismo (o da sociedade burguesa), como o momento em que esse mecanismo se desarranja.
O que se vê não é o desmoronar ruidoso de um mundo, mas sua deterioração sutil, incrustada em cada detalhe, em cada gesto das atrizes (soberbas).
Tudo que poderia ser indício de um universo sólido e feliz converte-se em sinal de crise. Nessa inversão está a maestria de "Mulheres", suspense de arrepiar e um olhar pessimista às coisas. Pessimista, mas nunca oportunista.(IA)

Filme: Mulheres Diabólicas
Produção: França, 1995
Direção: Claude Chabrol
Com: Isabelle Huppert, Sandrine Bonaire, Jacqueline Bisset
Onde: a partir de hoje nos cines Arouche A, Espaço Unibanco, Lumière 2 e circuito

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