São Paulo, domingo, 21 de abril de 1996
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A universidade e a comunidade

PAULO HENRIQUE COELHO

Há sete meses, o campus da USP (Universidade de São Paulo) passou a fechar nos finais de semana e feriados, deixando de atender 100 mil pessoas que para lá afluíam a procura de lazer.
Na época, circularam rumores que, embora o pretexto fosse a realização de obras, sua administração desejava acabar com esse tipo de atendimento à população.
Agora, alegando estragos ocorridos em suas instalações e que "o campus é uma área pública de uso especial e não um parque", tornou-se mais claro o desinteresse da instituição.
Uma das razões da baixa qualidade de vida na cidade de São Paulo é que sua área de parques, praças e jardins não atinge a metade do que seria desejável.
Na prática da arquitetura, constatamos a dificuldade que é a implantação de novas áreas de lazer gratuito para a população.
Os parques, embora tenham um baixo custo de infra-estrutura e equipamentos, necessitam terrenos grandes e bem-localizados, extremamente valorizados.
Um bom exemplo é o Parque Villa-Lobos, vizinho à USP. Criado há poucos anos, está correndo o risco de ser fechado, pois o Estado não tem como pagar a indenização da sua desapropriação.
A Cidade Universitária, instalada em um grande terreno, e com uma excelente infra-estrutura de acesso, segurança e conservação, veio suprir uma necessidade de lazer da cidade, para a qual não havia sido planejada.
A implantação de suas edificações foi feita de uma forma descentralizada, isto é, as diversas faculdades encontram-se distantes entre si, proporcionando grandes áreas verdes entre elas.
É interessante notar a total compatibilidade das duas utilizações, pois durante a semana os prédios estão em uso e seus jardins, vazios.
Nos finais de semana e feriados, suas áreas verdes eram tomadas por crianças soltando pipas, garotos andando de bicicletas e pessoas simplesmente descansando nos gramados.
É importante notar que o lazer aproximou um grande número de pessoas da universidade, pessoas que jamais teriam oportunidade de conhecê-la mais de perto.
Se, no aspecto educacional, podemos até criticar a distância entre os prédios pelo pouco convívio que gera entre seus alunos, com o lazer temos a completa utilização de um bem público.
Interessante é que, olhada pelo ângulo da arquitetura, essa situação era um sucesso. Por outro lado, para a instituição, resumia-se a áreas verdes estragadas, vidros quebrados etc. Enfim, uma grande fonte de problemas.
Entre os prejuízos alegados para o fechamento do campus nos finais de semana e feriados, foi citado o dano no sistema que conecta a universidade com a Internet, e assim "a USP ficou uma semana sem contato com o mundo".
A impressão é que a administração da USP valoriza mais o contado com o mundo do que com a comunidade na qual está inserida.
Em um país no qual o ensino superior é elitista e discriminatório, nossa universidade pública não deseja ser popular.

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