São Paulo, sexta-feira, 10 de maio de 1996
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Nova "Gaiola das Loucas" ataca a hipocrisia

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Na versão de 1978, feita por Edouard Molinaro, tudo chamava a atenção para os atores principais, Ugo Tognazzi e Michel Serrault -o casal de homossexuais.
Desta vez, ao contrário, Mike Nichols não enfatiza o trabalho de seus atores nem permite que seu brilho o desvie daquilo que tem a dizer.
A intriga segue em linhas gerais o original de Jean Poiret. Val (Dan Futterman), filho de Armand (Robin Williams), dono de uma boate gay, quer casar com a filha de um senador reacionaríssimo.
Mas como convidar seu futuro sogro à casa dos pais se Armand é casado com Albert (Nathan Lane), uma vistosa drag queen de meia-idade? Trata-se de armar o cenário.
Sem que eles saibam, porém, o senador Keeley (Gene Hackman) está encrencado. Seu aliado, o presidente de uma liga pela defesa dos bons costumes, acaba de morrer nos braços de uma prostituta, menor, negra. Enfim, também ele precisa de um cenário.
É esse jogo de aparências que vai gerar, em seguida, a série de mal-entendidos sobre os quais se apóia a comédia. Mike Nichols, como em seu "Uma Secretária de Futuro", toma todos os cuidados para não deixar o humor se levar pela irresponsabilidade (no caso, não ser dominada pelos trejeitos homossexuais etc.). Usa o humor para falar de uma sociedade fundada sobre a hipocrisia.
Para chegar a isso, apóia-se em uma série de detalhes que poderiam passar despercebidos a um cineasta menos atento aos atores. Exemplo: Dianne Wiest, a mulher do senador, se apresenta como uma sonsa. Olhando bem, parece uma drag queen. Isso não é acaso.
"A Gaiola das Loucas" talvez pudesse ir mais longe no humor. Durante toda a ação, o senador e a mulher ficam atentos ao estranho comportamento dos convivas, e isso fará a graça da coisa.
Enquanto isso, os homossexuais ignoram a saia justa em que está enfiado o senador. Se tivessem tomado conhecimento dela, poderia haver um cruzamento interessante de estupefações.
Mas isso é só uma hipótese. O certo é que Nichols é um cineasta mais profundo que Molinaro. E os anos 90 são mais propícios que os 70 para comédias em que os gays sejam agentes de humor -e não objetos. Talvez seja isso que a "Gaiola" francesa quis, mas não chegou a realizar.

Filme: A Gaiola das Loucas
Produção: EUA, 1996, 108 min.
Direção: Mike Nichols
Quando: a partir de hoje nos cines Astor, Top Cine, West Plaza 4 e circuito

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