São Paulo, sexta-feira, 10 de maio de 1996
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Direitos humanos, segurança e democracia

BENEDITO DOMINGOS MARIANO

A sociedade brasileira não pode mais deixar que episódios como os de Vigário Geral, Candelária, Carandiru, Corumbiara e Eldorado do Carajás sejam um dado do cotidiano. Não podemos mais banalizar a violência contra a vida humana.
Hoje fala-se muito em reformas. São urgentes e necessárias as reformas agrária, do sistema penitenciário e da estrutura de segurança pública do país. Esses, entre outros temas, foram tratados na primeira Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada nos dias 26 e 27 de abril, em Brasília, promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados em parceria com dezenas de entidades representativas da sociedade civil.
A conferência destacou, no que se refere à questão da mudança da estrutura de segurança pública no país, cinco propostas para o Plano Nacional de Direitos Humanos, que será lançado pelo presidente da República:
1) Mudanças de competência da Justiça Militar nos casos de crimes cometidos por PMs contra civis, projeto tramitando no Senado. A função de policiamento é de natureza civil, de modo que os crimes praticados por agentes nessa função devem ser julgados pela justiça comum e não por uma justiça da qual juízes são quase que absolutamente membros da corporação.
2) Criação de uma Secretaria Nacional da Segurança Pública, vinculada diretamente à Presidência da República, com atribuição de implementar, coordenar, supervisionar e acompanhar uma política nacional de segurança pública no país para que episódios como o de Eldorado do Carajás e tantos outros não sejam tratados como uma "operação de guerra".
3) Aprovação do projeto de lei que tipifique o crime de tortura, tramitando no Congresso desde agosto de 1994. A Constituição brasileira no seu artigo 5º, inciso XLIII, estabelece que a prática de tortura é um crime inafiançável e imprescritível. Entretanto milhares de crimes de tortura cometidos por agentes do Estado tramitam como delito de lesão corporal leve ou grave, que tem prescrição em dois anos.
4) Criminalização do porte, tráfico ou depósito ilegal de armas, como elemento fundamental para diminuir os índices de homicídios, que, em muitos casos, são cometidos por motivos fúteis. E o número de armas ilegais ultrapassa a casa dos milhões no país.
5) Aprovação do projeto que reformula o Conselho Nacional de Defesa da Pessoa Humana, ampliando suas atribuições e alterando sua composição.
Uma preocupação estava presente em todos os participantes da primeira Conferência de Direitos Humanos, de que o Plano Nacional de Direitos Humanos apresente alguns projetos prioritários a curto prazo e, sobretudo, que estabeleça junto ao Congresso um calendário de votação dos projetos que já tramitam no Legislativo.
No sábado, dia final da conferência, o presidente da República recebeu no Palácio da Alvorada uma comissão que foi entregar-lhe o resultado da conferência. Durante o encontro, o presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que o Plano Nacional de Direitos Humanos não será um plano de intenções e fará um esforço pessoal no sentido de que o Congresso estabeleça prioridade de votação nos temas principais do plano.
O anúncio do plano deverá representar um marco na perspectiva de se criar uma nova cultura de segurança pública, na qual os direitos fundamentais, consagrados em normas internacionais, sejam compreendidos por todos os setores, civil e militar, como valor universal inerente à pessoa humana e, por essa razão, sua promoção deve ser a base da construção democrática.
Assim como uma polícia transparente, legalista, democrática, equipada, com salários justos e comunitária representa elemento fundamental na garantia da segurança pública e da ação eficaz contra a criminalidade. A primeira Conferência Nacional de Direitos Humanos, sem dúvida, deu sua parcela de contribuição nessa tarefa que é de todos os democratas.

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