São Paulo, sábado, 11 de maio de 1996
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Vizinhos seguem 'toque de recolher'

JACQUELINE LATTARI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os moradores da região onde está instalado o Complexo Penitenciário do Carandiru, na zona norte de São Paulo, vivem em constante clima de medo.
A sirene acionada quando ocorrem fugas é o toque de recolher dos moradores. "Quando toca a sirene a gente fica esperta. Entra em casa e tranca tudo", disse Nadir Arenque, 50, dona-de-casa.
Nadir mora há 26 anos em uma casa que tem fundo para o necrotério do presídio. Segundo ela, nunca um detento entrou em seu quintal.
Ela diz que viu há cinco anos uma vizinha ser ameaçada com uma faca por um fugitivo que pulou a cerca e entrou na casa.
"Apenas uma cerca nos separa. Não existe nem sequer um muro. É um absurdo", disse.
Nelson Gouveia Júnior, 23, e Fábio Tavares, 24, moram em uma rua próxima ao complexo desde que nasceram. Eles dizem que suas famílias vivem trancadas em casa, com medo de sair.
Gouveia Júnior afirma que a única solução para as fugas é a desativação do presídio. "O governo deveria construir um estádio de futebol nesse local e transferir o presídio para o interior."
Outra moradora que defende a desativação do presídio é a dona-de-casa Ida de Oliveira Caldana, 57, há 37 anos vizinha do Carandiru. "Não vejo a hora de essa penitenciária sair daqui. Meu medo é ser feita refém em uma fuga ou levar um tiro durante um motim", disse.
Ida diz que quando escuta a sirene do presídio fica alerta e tranca a casa. "Sabemos quando acontece uma fuga porque os helicópteros sobrevoam a região à procura dos presos."
Segundo Ida, deveria ser realizado um recenseamento nos presídios. "Os presos de alta periculosidade deveriam ser separados dos ladrões de galinhas."
A dona-de-casa Iracema Braga Neri, 58, ao contrário da maioria de seus vizinhos, diz que não tem medo de morar perto do complexo. O presídio feminino fica nos fundos da casa onde ela mora há 25 anos.
"Há uns dez anos vi três presas pulando o muro. Fingi que não as vi e ficou tudo bem. Nós não temos nada com isso", afirmou.
Iracema diz que a única ocasião em que teve medo foi durante a rebelião de 92 em que 111 presos foram mortos. "Parecia uma guerra. O clima de tensão era muito grande", disse.
Segundo a Embraesp (Empresa Brasileira de Estudos do Patrimônio), a região do Carandiru é extremamente desvalorizada.

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