São Paulo, quinta-feira, 16 de maio de 1996
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Finalmente

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Algum dia teria que acontecer. Duas ações do governo, tomadas esta semana, merecem registro e louvor. A primeira foi a intenção de abrir os planos de saúde para empresas internacionais, providência mais importante do que a abertura da cabotagem, medida que precisou de revisão constitucional.
O ideal seria que o Estado administrasse uma estrutura de saúde pública que dispensasse esse recurso. Aliás, foi essa uma das promessas da campanha eleitoral de FHC. Com a criminosa falência do sistema, agravada pela vigência do regime neoliberal, a única alternativa ficou sendo o plano de saúde. Foi a Rede Globo, e não o governo, que defendeu a sociedade contra os abusos verificados na prestação desses serviços, cada vez piores e cada vez mais caros. Apesar disso, louve-se a ameaça feita aos tubarões da saúde que ocuparam o vácuo deixado pelo Estado.
Outra medida que merece louvor: a indenização à família de uma das vítimas da repressão política. É prática civilizada. A Alemanha paga até hoje indenizações aos parentes das vítimas do nazismo. É uma questão de justiça, e não de ideologia.
Começa a ser aberto o caso Marighella. Todos sabíamos que ele havia sido vítima de uma emboscada e assassinado friamente nas ruas de São Paulo. Sua opção pela luta armada, no contexto da época e da circunstância, foi tão heróica quanto a de Zumbi, três séculos antes. O processo social brasileiro repele o radicalismo, mas há momentos específicos em que a solução radical se apresenta como a única possível. Foi assim que surgiram heróis como frei Caneca, Felipe dos Santos, Tiradentes e o próprio Zumbi.
Pode parecer exagero incluir Marighella nesse panteão. Grande parte da opinião pública, influenciada pelo poderoso marketing da direita, ainda o considera apenas um bandido.
Desta vez, no entanto, não vamos repetir o caso de Zumbi, esperando 300 anos para fazermos justiça a um amante da justiça social, a um guerrilheiro da liberdade.

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