São Paulo, domingo, 26 de maio de 1996
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Sesi e Senai gastam verbas sem critério

JOSIAS DE SOUZA
Secretário de Redação
ANTONIO CARLOS SEIDL

JOSIAS DE SOUZA; ANTONIO CARLOS SEIDL
DA REPORTAGEM LOCAL

Parte dos recursos para financiar educação e lazer de trabalhadores é gasta em obras faraônicas e eleitoreiras

Parte do dinheiro do Sesi e do Senai vem sendo desviada de suas finalidades legais. Os recursos, considerados públicos, deveriam financiar cursos de capacitação de mão-de-obra e atividades de lazer para os trabalhadores da indústria. Mas acabam custeando também gastos como a construção de luxuosas sedes de federações da indústria e até despesas de cunho eleitoral.
Criados pelo governo há 50 anos, o Sesi (Serviço Social da Indústria) e o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) são geridos pelos empresários da indústria. Apuração realizada pela Folha verificou que os critérios de gestão nem sempre são empresariais.
As distorções espalham-se pelo país. No Piauí, Estado com indústria incipiente e com o menor PIB do Nordeste (R$ 590,2 milhões em 95), erigiu-se, com verbas do Sesi, uma sede de US$ 6 milhões para a federação das indústrias.
Em Sergipe, o Sesi financiou, ao custo de R$ 200 mil, a construção de um estádio de futebol na cidade de Areia Branca, vizinha à capital, Aracaju. Não há na cidade uma única indústria. O estádio comporta um público de 3.000 pessoas, cerca de 30% da população local.
Em Presidente Epitácio (675 km a oeste de São Paulo), utilizaram-se US$ 15 milhões do Sesi para pôr em pé um hotel padrão cinco estrelas, com 128 apartamentos e nove chalés.
A obra, pronta há um ano e meio, está às moscas. Busca-se agora uma empresa disposta a arrendar o hotel.
As unidades estaduais do Sesi, chamadas de Departamentos Regionais, são administradas pelas federações da indústria. Os negócios praticados nem sempre servem aos interesses do Sesi.
Fiesp
Um exemplo: o Sesi é dono de dois terços do imponente edifício sede da Fiesp, no número 1.313 da avenida Paulista. E aluga à própria Fiesp e ao Ciesp (Centro das Indústrias do Estado) uma área de 4.267 metros quadrados.
O preço do aluguel, reajustado em julho de 95, é bem camarada: R$ 9,00 por m2. Os valores reais de mercado oscilam de R$ 28,00 a R$ 30,00 por m2.
Assim, a Fiesp/Ciesp paga ao Sesi pelo menos R$ 19,00 reais abaixo dos valores de mercado por m2. A defasagem resulta num prejuízo anual para o Sesi de R$ 972,8 mil.
Essa não é a única operação imobiliária lesiva aos interesses do Sesi em São Paulo. Em maio de 95, decidiu-se que a entidade deveria desocupar um outro prédio que possui na Paulista. Chama-se Edifício Theobaldo de Nigris e situa-se no número 750. São 17 andares, num total de 12.495 metros quadrados.
O prédio está vazio desde então. Os valores de mercado para locação deste edifício variam de R$ 20,00 a R$ 25,00 por m2.
Perdas
O Sesi amargou uma perda de receita de pelo menos R$ 3 milhões nesse período de um ano. Sem mencionar os R$ 20,7 mil mensais que teve de desembolsar para pagar as taxas de manutenção do imóvel, que incluem água, luz, telefone e tributos municipais.
O Theobaldo de Nigris será alugado para o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a partir de 1º de junho. O preço de locação será de R$ 300 mil mensais, ou R$ 24,00 por m2. Valores condizentes com os de mercado.
Desalojado da Paulista, o Sesi foi acomodado num conjunto de prédios, na rodovia Anhanguera, que é fruto de outra transação polêmica, noticiada na época.
O Sesi pagou pelo imóvel da Anhanguera, em 92, a quantia de US$ 14,5 milhões. Dois anos antes, avaliação da Caixa Econômica Estadual havia cotado o imóvel por bem menos: US$ 6,9 milhões.
Todo o mercado imobiliário avaliava então que o Sesi desembolsou mais do que deveria.
Eleições
Em Minas Gerais, utilizou-se a estrutura do Sesi nas eleições de 94. Então presidente da Fiemg (Federação das Indústrias de Minas), José Alencar Gomes da Silva decidiu candidatar-se ao governo de Minas. E trocou o apoio político de prefeitos mineiros por centros de atividade do Sesi, construídos indiscriminadamente pelo interior do Estado. Estima-se que, só durante a campanha, a conta tenha ficado em US$ 28 milhões.
Os efeitos da gastança são sentidos hoje. Sucessor de Gomes da Silva, o atual presidente da Fiemg e do Sesi local, Stefan Salej, não tem como manter tantas edificações, chamadas de CATs (Centros de Atividades do Trabalhador).
Pediu ajuda financeira à direção nacional do Sesi. Quer, de resto, demitir pessoal e ceder os CATs, em comodato, às prefeituras.
A fiscalização das despesas realizadas pelo Sesi e Senai deveria ser feita pelo Ministério do Trabalho e pelo TCU (Tribunal de Contas da União). Mas o sistema é ineficaz.
Entre os técnicos do TCU, os documentos de prestação de contas das entidades são conhecidos como "defuntos americanos", em alusão à "maquiagem" que impede a identificação de desvios.

Colaborou a Agência Folha

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