São Paulo, domingo, 26 de maio de 1996
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Estilistas investem na sujeira sofisticada

ROGERI SCHLEGEL
DA REPORTAGEM LOCAL

No mundo da moda, bonito hoje é ser sujo. Nos desfiles, os cabelos dos modelos levam produtos que tiram o brilho e o volume, e a pele é maquiada para que pareça suada e ensebada.
"É o trashy-chic", avisa o estilista Jeziel Moraes, 32, usando uma expressão que significa algo como "imundo sofisticado".
Diante do modelo de banho tomado, o cabeleireiro saca produtos como Pommade, de Paul Mitchell, e lambuza seus cabelos.
"Depois, ainda dá uma amassada. Pronto: o cabelo fica parecendo que não vê pente há muito tempo", explica Moraes.
No rosto, pescoço e braços, é usada uma espécie de brilho para dar aspecto de gorduroso.
Tudo estilizado. "O negócio não é ser sujo, mas parecer sujo", adverte o estilista. "Ninguém no chamado mundinho fashion gosta de quem não toma banho."
O modelo Fábio Ghirardelli, 27, acha que dar aparência de sujeira aos manequins "é um exagero" (leia depoimento nesta página).
Vítimas da moda
As pessoas que gravitam em torno do mundo da moda acompanham a tendência. Muitos frequentadores do Mercado Mundo Mix, feira em que são vendidas roupas e acessórios tidos como modernos, não usam uma peça sem antes picá-la, pisoteá-la ou sujá-la "casualmente" com tinta.
"A moda pede esse visual decadente", garante a produtora Fabíola Kassin, 26.
Quase cafona
O culto à sujeira é subtendência de um movimento maior na moda -a glamourização do gosto duvidoso, nas palavras de Moraes.
"É a estética da decadência", define Marcelo Sommer, 28. "Todos procuram a mulher feia-bonita", tenta explicar Caio Gobbi, 21.
Os próprios estilistas admitem que não é uma tendência fácil para o grande público.
Maquiagem imitando olheiras, saias usadas com calça por baixo e combinações do verde pistache com o marrom alaranjado enchem as passarelas, mas são difíceis de encontrar na rua.
"A distância para o que é realmente cafona é pequena", admite Moraes. "Só um grupo pequeno de pessoas tem informação suficiente para usar essa moda."
Caio Gobbi conta que uma das que estranham é sua mãe. Sempre que vai sair, ela comenta que está feio e mal vestido.
"Muito obrigado", responde Gobbi, que encara o comentário como um elogio.
(RSc)

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