São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 1996
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FHC, Ximenes e o futuro do Banco do Brasil

RICARDO BERZOINI; ALENCAR FERREIRA

RICARDO BERZOINI e
ALENCAR FERREIRA
Há cerca de dois meses, a sociedade brasileira via Paulo Cesar Ximenes, presidente do BB (Banco do Brasil), admitir um rombo de R$ 4,2 bilhões em 95, eximir-se de responsabilidade sobre o maior prejuízo apresentado por um banco na história e apresentar um plano de capitalização visando seu saneamento.
O governo, dentro de sua estratégia de marketing, assumia um "mea culpa" do Estado, jogava a carga do fracasso nos últimos 200 anos de administração do banco e assumia o compromisso, diante dos holofotes da imprensa, de modernizar e fortalecer a instituição.
Para o bem da verdade, é preciso esclarecer os fatos e apontar com seriedade os motivos que levaram o Banco do Brasil a acumular um megaprejuízo, pelo qual Ximenes tem responsabilidade -e muita.
Em primeiro lugar, devem-se ressaltar os efeitos da inadimplência no período pós-Real e a gestão de Ximenes diante do quadro de grave crise financeira.
Em vez de buscar soluções que acomodassem parcialmente as demandas setoriais, por meio de um processo seletivo de renegociação das dívidas (com distinção entre devedores contumazes e conjunturais, grandes e pequenos etc.), Ximenes, contrariando a postura adotada pelos grandes bancos do sistema financeiro nacional, foi absolutamente intransigente para com os devedores.
Essa estratégia não só fez aumentar a inadimplência como potencializou a atuação da bancada ruralista no Congresso, ciosa por defender os interesses dos maiores devedores do Banco do Brasil.
Em segundo lugar, Ximenes também esconde propositadamente, ao acusar os antecessores, o tratamento diferenciadamente positivo dado pelo Tesouro à sua gestão, ao acertar pendências com o banco que há muito vinham sendo discutidas sem solução.
O acordo sobre a dívida com o INSS representou um impacto positivo da ordem de R$ 1,3 bilhão nas contas do BB no ano passado. O reconhecimento de dívidas por parte do Tesouro significou receitas da ordem de R$ 765 milhões.
Confirmando a tese de que falta ao BB direção técnica qualificada, vemos hoje os resultados da ofensiva de marketing anunciada em março; plano de capitalização fracassado e fuga dos investidores.
Da meta de R$ 1,3 bilhões de captação entre os acionistas minoritários, foram atingidos irrisórios R$ 9 milhões, como decorrência, principalmente, do anúncio nada estratégico de Ximenes de que o banco acumularia prejuízo de R$ 6 bilhões neste primeiro semestre.
E, como se não bastasse a constatação da falta de capacitação técnica dos atuais administradores, cidadãos, acionistas, correntistas e funcionários são brindados com a notícia de que, mais uma vez, o BB é vítima do vale-tudo das negociatas políticas do governo.
FHC, para aprovar a reforma da Previdência -que significa retirar direitos dos trabalhadores do texto constitucional-, negocia os votos das bancadas mineira e ruralista do Congresso, numa operação que envolve R$ 7,9 bilhões do caixa do Banco do Brasil.
Socorre, com o dinheiro do contribuinte, a empreiteira Mendes Júnior, famosa por ser uma das maiores devedoras dos bancos federais e tradicional financiadora de campanhas políticas, inclusive a do próprio presidente.
Do "acerto" com os líderes ruralistas resulta a renegociação de R$ 7 bilhões da dívida dos proprietários rurais.
O escândalo dessa operação político-financeira, além de ser mais um registro da persistência do "é dando que se recebe", triste marca dos últimos governantes, é também prova da falta de seriedade na gestão do maior banco do país.
De nada adianta afirmar que o compromisso do BB é com o lucro, se ele tem de atender ao fisiologismo federal e sobreviver às mazelas da incompetência administrativa.
Como saldo, restam apenas o prejuízo para a sociedade e a tradicional indefinição sobre o futuro do banco. E assim caminha a modernidade de FHC.

Ricardo Berzoini, 36, é presidente do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e região. Alencar Ferreira, 32, é membro da comissão de empresa dos funcionários do Banco do Brasil.

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