São Paulo, domingo, 9 de junho de 1996
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ONGs vivem fenômeno "chapa-branca"

XICO SÁ

XICO SÁ; ABNOR GONDIM
DA REPORTAGEM LOCAL

As organizações não-governamentais recebem recursos oficiais e não passam por fiscalização rigorosa

ABNOR GONDIM
As ONGs brasileiras contrariam o sentido da sigla (organizações não-governamentais) e estão cada vez mais oficiais: recebem recursos e atuam em parceria com órgãos públicos.
O fenômeno "chapa-branca" das entidades se enquadra na classificação utilizada recentemente pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (um ex-militante de ONG), que as definiu como "neo-governamentais".
Nascidas no seio da oposição ao regime militar (1964-85), a maioria abandonou o perfil alternativo e contestador e faz parceria com o governo, ocupando assentos privilegiados em conselhos oficiais.
Com poder, as ONGs estão influenciando a aplicação de recursos públicos e externos no valor de R$ 1,4 bilhão nos ministérios do Meio Ambiente e da Previdência Social e junto a bancos internacionais. Somente o Projeto Piloto de Proteção das Florestas Tropicais repassa R$ 22 milhões a ONGs.
Vários países repassam dinheiro para as suas entidades, mas fiscalizam o uso dos recursos. O Brasil não tem controle rigoroso sobre seus gastos nessa área.
Parcerias
Pesquisa por amostragem feita recentemente pela Abong (Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais) revelou que 70% das filiadas mantêm alguma parceria com órgãos públicos.
Com a redução da entrada de dinheiro de entidades estrangeiras para as nacionais, governo federal, Estados e municípios têm aumentado sua importância na vida financeira dos "ongueiros".
O Ibase, conhecido como a ONG do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, é uma mostra dessa situação. Há dois anos, a cooperação internacional representava cerca de 80% do orçamento da entidade.
Hoje, segundo informação de seu diretor-executivo, Cândido Grzybowsky, o volume de auxílio do exterior caiu para cerca de 30%. A ONG teve um orçamento de US$ 4,5 milhões em 1995.
O Ibase recebeu das estatais do governo federal cerca de R$ 700 mil no ano passado.
A verba foi gasta em publicidade da campanha "Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida". A ONG de Betinho completa o orçamento com doações de particulares e venda de produtos e serviços, como pesquisas, por exemplo.
Preocupação
As publicações da Abong, que é dirigida pelo sociólogo Sílvio Caccia Bava, têm revelado a preocupação dos próprios "ongueiros" e das fontes financiadoras estrangeiras com a "governalização" dos não-governamentais.
Em 1995, por exemplo, Bradfort Smith, da Fundação Ford no Brasil, alertava para o risco de as ONGs perderem a autonomia à medida que cresce o bolo de recursos públicos em seus cofres.
A Fundação Ford, dos EUA, é uma das principais fontes de recursos estrangeiros das entidades não-governamentais.
As agências norte-americanas destinam cerca de US$ 30 milhões por ano para as ONGs brasileiras. Outros US$ 130 milhões são repassados por entidades européias, segundo dados da Abong.
O Banco Central divulgou, em estudo feito há dois anos, que US$ 400 milhões chegam ao Brasil todo ano para as não-governamentais.
Segundo Caccia Bava, existem muitas entidades "picaretas" que se fazem passar por ONGs apenas com a finalidade de obter benefícios oficiais. Além de receber verbas públicas, as entidades são isentas do Imposto de Renda.

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