São Paulo, terça-feira, 11 de junho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A genética das idéias

MARIA ERCILIA
DO UNIVERSO ONLINE

Idéias podem ser infecciosas. Já dizia William Burroughs que a linguagem é um vírus. O que faz uma moda "pegarïï ou uma ideologia se propagar é um mistério. Por que uma gíria, por exemplo, se espalha rapidamente e depois morre?
Na cola da ressurreição do darwinismo, que é outra moda que pegou, um biólogo chamado Richard Dawkins criou uma teoria da propagação das idéias intitulada "meméticaïï, por analogia com genética.
Dawkins, professor da Universidade de Oxford, acredita que as idéias se comportam como genes, usando os seres humanos como hospedeiros. Para Dawkins, a pergunta do ovo e da galinha não tem mistério: a galinha é apenas a forma de sobrevivência do ovo -e as idéias usam os seres humanos para se propagar. Simples assim.
O livro em que Richard Dawkins apresenta sua teoria dos "memesïï, "O Gene Egoístaïï, é de 1976. Mas há uns quatro anos a memética criou um verdadeiro culto na Internet.
Há grupos de discussão sobre o assunto, como "alt.memeticsïï. Há uma revista chamada Meme, seções de revistas já absorveram o nome (veja "Ways and Memesïï, da Spiv).
Mais: existe até uma banda chamada "The Selfish Geneïï (http:// members.tripod.com/~geraldd/index.html). A palavra meme (em inglês, pronuncia-se "mimeïï) já foi tranquilamente incorporada ao jargão da rede.
Há ainda um boletim sobre tecnologia chamado Meme e os endereços www.meme.com e www.meme.net foram devidamente registrados.
Dawkins desperta controvérsia, o que é compreensível. Há quem considere sua teoria uma heresia reducionista, que reduz a cultura humana a -literalmente- um caldo de cultura.
Outros, como o professor de ciência cognitiva Daniel Dennett e o cientista da computação Daniel Hofstader, tomaram a teoria do meme e a estenderam. Dennett radicaliza -ele acredita que a biologia explica absolutamente tudo.
Faz sentido que a memética tenha encontrado tanta receptividade na Internet, onde idéias e teorias parecem mesmo pulular como organismos, como se tivessem uma existência autônoma, desvinculada de seus autores.
A teoria de Dawkins se encaixa muito bem numa tendência atual que enxerga o ser humano como uma máquina, programável, e as máquinas como tão autônomas e poderosas que parecem seres vivos.
Seu último livro, "Um Rio Que Corre do Édenïï (recém-lançado no Brasil pela Rocco) leva a idéia mais longe: toda a história da evolução seria a história da transmissão bem-sucedida de informações. Ou seja, toda a vida estaria a serviço do DNA...
A teoria de Dawkins não deixa muito espaço para o humanismo ou para absolutos morais. As idéias se dividiriam puramente entre mais e menos aptas a sobreviver, ou a ser reproduzidas.
Embora seja uma metáfora engenhosa, a idéia do meme tem problemas: até prova em contrário, sistemas filosóficos não são uma espécie de gripe e uma cultura não pode ser reduzida a algumas sequências de DNA.
Endereços relacionados à memética:
http://pespmc1.vub.ac.be/
http://143.236.107.53/authors/kkitow/memetics/
http://www.physics.wisc.edu/~shalizi/hyper-weird/memetics.html
E-mail: netvox@folha.com.br

E-mail netvox@folha.com.br

Texto Anterior: Teatros exibem traileres de peças
Próximo Texto: Começa hoje a primeira Feira do Livro da Bahia
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.