São Paulo, segunda-feira, 17 de junho de 1996 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
O futuro não existe
JOSIAS DE SOUZA São Paulo - O Brasil é viciado em mudança. Em nenhum lugar faz-se tanta e tão frenética promoção das mudanças como aqui. E, no entanto, muda-se pouco. Muito pouco. Quase nada.Ainda se diz que o Brasil é o país do futuro. Mas esse Éden intocado está sempre na dependência de uma reforma. Qualquer reforma. "Antes de repartir o bolo, é preciso esperar que ele cresça." Quem não se lembra? Vivíamos sob os efeitos do milagre econômico, e o futuro já estava enganchado em uma condicionalidade. Sobreveio a fase em que nada seria feito, nenhum problema seria enfrentado antes da reconquista das eleições diretas. Vieram as diretas. E com elas uma nova onda mudancista. A Constituinte tornou-se nossa prioridade feroz. Construiu-se sobre o papel uma Canaã. Ulysses "Moisés" Guimarães batizou-a "Cidadã". Eram páginas encharcadas de leite e mel. Saliva escorrendo pelo queixo, o brasileiro preparava-se para sorver o néctar, que jorrava de tão generosa Constituição, quando foi colhido por novas prioridades. Ora a inflação, ora o plebiscito, ora a inflação novamente, ora o emendão, ora o impeachment, ora o escândalo do Orçamento, ora isso, ora aquilo... O real e Fernando Henrique renovaram ilusões, logo soterradas por outras reformas inadiáveis. A Constituição, antes redentora, virou um satã a ser exorcizado. Assim é que a cada dois passos à frente recuamos três ou quatro. Derrubamos um presidente, mas não conseguimos punir banqueiros desonestos. Somos incapazes de castigar donos de clínicas e shoppings criminosos. Derrubamos a inflação, mas não distribuímos a renda. O Brasil muda, muda, mas não se livra de velhos rótulos. Ainda é o "país da impunidade", o "país das desigualdades sociais". Seu presente de eternas reformas faz do Brasil uma nação sem amanhã. Texto Anterior: PRETO NO BRANCO Próximo Texto: O fim das reformas? Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |