São Paulo, quarta-feira, 19 de junho de 1996
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Favela arma barricada contra remoção

ROGÉRIO GENTILE
DA REPORTAGEM LOCAL

Moradores de Heliópolis (zona sul de São Paulo) montaram ontem barricadas em duas entradas da favela para evitar que a prefeitura e a polícia tentassem desocupar a área nas imediações do prédio incendiado anteontem, onde morreram quatro pessoas.
As barricadas eram feitas com entulho e até com carroças usadas para coletar papel.
Armados com pedaços de madeira, ferros, canos e pedras, os moradores diziam que não aceitariam ser transferidos para um alojamento em Santa Etelvina (zona leste), como chegou a ser anunciado pela prefeitura.
A mobilização foi uma reação aos boatos, surgidos ontem de manhã, de que a polícia invadiria a favela às 11h, para remover os moradores dos outros dois prédios semiconstruídos da Cohab (que ficam ao lado do incendiado) e dos demais barracos da área.
Matar ou morrer
"Estamos dispostos a matar ou morrer, mas ninguém tira a gente daqui para levar a qualquer lugar", disse o segurança David Salmista Saboia Farias, 30, que afirma ser um dos líderes da favela.
"Queremos um local definitivo e que seja próximo daqui. Não podemos ficar longe do nosso trabalho e da escola de nossos filhos."
"Não somos bichos para nos levarem para o meio do mato", disse o operador Francisco José Rodrigues de Oliveira. "Vai levar pau quem tentar entrar aqui à força."
"Muita gente vai se machucar", afirmou o desempregado Francisco Gonçalves, 29.
No dia do incêndio, 30 caminhões da prefeitura estiveram no local para transferir os desabrigados para o alojamento, mas a proposta não foi aceita.
Os desabrigados acabaram indo para uma escola próxima à favela.
Cingapura
Segundo Farias, os moradores devem ser levados para o prédio do Cingapura que fica na divisa com São Caetano. "Os prédios estão prontos e desocupados." A Secretaria da Habitação não confirmou a informação.
Apesar de a favela ser considerada um reduto do PT, Farias afirma não pertencer a nenhum partido.
Ele mora no quinto andar de um dos prédios semicontruídos. Sua moradia é uma das poucas construídas em alvenaria.
Às 13h30, cinco veículos da PM foram à favela, depois que, pelo telefone 190, foi feita uma denúncia de que oito pessoas armadas com revólveres estariam no prédio destruído, que está interditado, esperando para enfrentar a suposta invasão policial.
Os policiais entraram no prédio, mas encontraram apenas o operador Ricardo Miguel da Silva, que tentava encontrar, no meio dos escombros, seus documentos.
A situação ficou mais calma às 14h15, quando o delegado Antônio Carlos da Silva, do 95º DP, foi até a favela com dois policiais. "Não haverá invasão nenhuma", disse.

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