São Paulo, quarta-feira, 26 de junho de 1996
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Avignon contrapõe Lenise e Kleemann

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Os 50 anos do festival de teatro de Avignon, na França, servem de pretexto para um encontro esperado no teatro do Brasil.
Lenise Pinheiro e Fredi Kleemann, dois fotógrafos distantes algumas décadas, estão lado a lado na mostra que começa dia 11 no interior da França, permitindo apontar o que mudou, se não no próprio palco brasileiro, na visão dele pela câmera.
Um teatro que, como chegou a dizer o crítico e historiador teatral Décio de Almeida Prado, tinha um projeto. Tinha uma forma, em torno da qual tudo gravitava.
Com o tempo, e as fotos de Kleemann são evidência, caíram as diferenças entre o início e o fim do velho ciclo. Até na idade -de Cacilda Becker a Lílian Lemmertz a Renato Borghi, surgem todos jovens e vibrantes, mesmo que posando.
Cacilda Becker, em particular, em foto de quase meio século atrás, de "A Dama das Camélias", está no esplendor.
O ciclo é outro, visto por Lenise Pinheiro. Muitos outros, na verdade: não há um projeto, qualquer forma é possível.
É o que mostram as imagens, que podem ser coloridas ou não, em cena ou não, montadas ou não. Até posadas. O que Lenise Pinheiro busca, ao que se indica, é o jogo emocional, ou é a verdade, tome ela que forma tomar.
A bandeira sobre o belo traseiro vem de um ambiente, de um espetáculo, estranhamente, todo ele formalista. Mas sexo e música estavam lá, para a fotógrafa achar.
Petrônio Gontijo e Marco Ricca, em "Dois Perdidos numa Noite Suja", posam. Mas o olhar e a sensualidade presente, sobretudo na imagem do corpo tenso e da observação distante do outro, nada têm de artificiais, pelo contrário.
No rosto de Bete Coelho, em "Fim de Jogo", a lágrima está já quase morta, perdida sob a composição gestual, mas é a lágrima que a fotógrafa vai buscar. E por aí vai.
Lenise Pinheiro não grava a cena de uma peça -nem mesmo em seu momento histórico de primeira atriz, como na mais feliz das tantas poses de Kleemann, com Cacilda Becker.
Ela grava o indivíduo isolado, em meio à ação do teatro, e não o momento histórico. Parece nem ter olhos para o todo. Até porque o todo nem sequer existe, hoje. O momento histórico é disforme.

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