São Paulo, domingo, 30 de junho de 1996
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Acampamento rejeita ideal socialista

ESPECIAL PARA A FOLHA

Dois lugares-comuns sobre os sem-terra são refutados pela pesquisa Datafolha. O primeiro é o que aponta os acampados como os últimos defensores da propriedade coletiva e do ideal socialista, depois que a esquerda partidária foi obrigada a rever seus princípios e abandonar essas bandeiras.
O segundo é o que vê no movimento um reduto eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva e, por extensão, um braço do PT.
A pesquisa revela que Fernando Henrique Cardoso e Lula ficaram empatados, com 35% dos votos cada um entre os entrevistados, na eleição presidencial de 1994.
Propriedade privada
Quando perguntados sobre o sistema de posse da terra que acham melhor, 75% dos sem-terra afirmam ser o "particular". Outros 19% dizem preferir a propriedade "coletiva" e 6% respondem que não sabem.
Na avaliação do sociólogo Ricardo Abramovay, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, estudioso da questão agrária, o resultado "mostra com clareza que os acampados não podem ser encarados como guerrilheiros em potencial, radicais esquerdistas dispostos a enfrentar e derrubar o regime".
Quando a pesquisa do Datafolha aborda não a posse da terra, mas se refere ao sistema de produção preferido pelos sem-terra, os resultados não são tão enfáticos. Enquanto 53% dizem preferir o sistema particular, outros 43% optam pelo sistema coletivo de produção.
Subir na vida
Esses dados, segundo Abramovay, podem induzir a erros, provavelmente suscitados por uma "imprecisão" na formulação da pergunta.
"Quando dizem preferir o sistema coletivo de produção, os sem-terra certamente não estão defendendo a propriedade coletiva dos meios de produção, para falar em jargão marxista", diz Abramovay.
É mais correto pensar, prossegue ele, que "estão se referindo à cooperação entre os agricultores, como ocorre em qualquer parte do mundo".
Reforçando a hipótese do sociólogo, 62% dizem que a maior vantagem do assentamento, caso ele ocorra, é a independência financeira. Outros 37% afirmam ser uma melhor condição de vida. Apenas 8% acreditam que o assentamento é bom porque permite o trabalho em cooperativa.
Para a antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, do Departamento de Antropologia da USP, os dados sobre preferências eleitorais "bastam para mostrar a enorme defasagem entre as lideranças do MST e os acampados".
Também em relação à avaliação do desempenho do governo FHC pelos sem-terra, os dados apontam para a divisão.
Enquanto 15% consideram o governo bom ou ótimo, 34% dizem que é regular e 43% que a gestão FHC é ruim ou péssima.
Os sem-terra tendem, no entanto, a culpar o Executivo pela má distribuição de terra. Para 51%, o governo é o principal responsável. Os grandes fazendeiros vêm em segundo, com 20% de culpa.

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