São Paulo, domingo, 30 de junho de 1996
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Balanço sem correção faz resultado ficar distorcido

Investidor deve tomar cuidado com os números das empresas

MILTON GAMEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Os investidores em ações devem ter cautela. Se os balanços das empresas brasileiras já eram suspeitos na época da inflação elevada, que inflava os resultados das companhias mais capitalizadas, este ano as demonstrações contábeis estão mais frágeis ainda.
O alerta foi dado, na semana passada, por diversos pregadores habituais do mercado de financeiro e de capitais, de Roberto Faldini (Abrasca) ao ex-ministro Antônio Delfim Netto (Planejamento), de Jair Ribeiro da Silva Neto (Banco Patrimônio) a Francisco Céspede (Ibef), de Ariovaldo dos Santos (USP) a Antoninho Marmo Trevisan (Trevisan Auditores).
O que eles têm em comum é a preocupação com o fim da obrigatoriedade do uso da correção monetária integral nos balanços das companhias. Números que antes eram religiosamente deflacionados pelos contadores agora podem ser publicados sem qualquer correção, por conta do processo de desindexação da economia.
Com isso, sustentam eles, os analistas do mercado de capitais perderam a base de comparação dos resultados históricos das companhias. Não dá para saber o quanto a inflação, ainda expressiva -12,36% nos últimos 12 meses, segundo o IGP-M-, está alterando os números vitais das empresas, como estoques, margens de lucro e outros itens.
Ficção
Na crueza dos balanços sem correção, os números não espelham mais a realidade das empresas, o que pode levar a erros de avaliação na hora da compra das ações nas Bolsas. Pior para todos.
"Os balanços viraram peça de ficção contábil. Isso é ruim, pois os investidores estrangeiros querem parâmetros internacionais para medirem o desempenho das empresas abertas antes de investir nelas", disse Trevisan, durante seminário sobre o tema na Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), na segunda-feira passada.
Trevisan explicou que, pela legislação societária (sem correção), os lucros das empresas mais capitalizadas aumentam, o que gera um pagamento de Imposto de Renda exagerado e leva a uma distribuição demasiada de dividendos sobre o lucro. A longo prazo, essa situação termina por descapitalizar as empresas.
As companhias com pouca liquidez ou com prejuízo operacional acabam parecendo estar em pior situação financeira do que realmente estão, avaliou Trevisan.
Delfim Netto e o professor de contabilidade Ariovaldo dos Santos também condenaram, no seminário, o fim da atualização monetária dos balanços.
Eles prevêem que uma nova versão da Lei nº 8.200 terá de ser adotada no futuro, para compensar as distorções atuais da legislação contábil e societária.
Expurgo
Para quem não se lembra, a Lei nº 8.200 foi criada em 1991, após uma enxurrada de ações contra o expurgo, nos balanços, da correção monetária do Plano Collor.
Céspede e Silva Neto demonstraram a mesma preocupação num café da manhã promovido pelo Ibef (Instituto Brasileiro de Executivos Financeiros), na terça-feira.
"Os analistas do mercado evitarão recomendar papéis das empresas menos transparentes", disse Silva Neto.

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