São Paulo, terça-feira, 2 de julho de 1996
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O mistério do falso socorro ao BB

ALOYSIO BIONDI

No espaço de poucos dias, o governo FHC aproveitou duas oportunidades para novamente apresentar o Banco do Brasil como um imenso problema para o país.
Primeiro, anunciou que o banco, após o (falso) prejuízo de R$ 4,2 bilhões em 1995, voltaria a perder nada menos que R$ 6 bilhões no primeiro semestre deste ano.
Logo em seguida, afirmou que o grande salto observado na dívida do governo, em maio, foi consequência do "socorro" de quase R$ 8 bilhões ao BB, destinado à concretização do aumento de capital anunciado em abril.
A política de desmoralização do BB, empreendida pela equipe FHC/BNDES, é um mistério digno da vigilância do Congresso e da opinião pública -pois pode desembocar em um dos maiores "negócios da China" já registrados no Brasil.
Por quê? As frequentes notícias negativas espalhadas pela equipe derrubaram os preços das ações do BB nas Bolsas da faixa de R$ 13 para R$ 9.
Como os prejuízos alardeados para o BB na verdade não existem na escala anunciada, pode-se prever que, dentro de alguns meses, as cotações voltarão a subir. Basta que elas cheguem aos níveis anteriores e haverá lucros de 50%, na casa de centenas de milhões de reais, para os grupos "bem informados" que tiverem comprado as ações ao longo do período.
Isso não é tudo. Levando-se em conta o maquiavelismo com que a equipe FHC/BNDES tem agido, não é exagero temer, ainda, que nesse momento o governo venha até a propor a privatização do BB, com a venda do controle a esses grupos que já tiverem acumulado ações do banco. Fantasioso? E as privatizações a preço de banana que vêm ocorrendo? Quem poderia prevê-las?
*Prejuízo falso - o prejuízo de R$ 6 bilhões para o primeiro semestre foi inventado pela equipe FHC/BNDES.
Pelas regras do Banco Central, os bancos devem lançar como prejuízos em seus balanços as dívidas não-pagas somente após 360 dias (um ano), quando o cliente tiver oferecido garantias no contrato (por exemplo, uma fazenda, uma casa, um automóvel etc.). Quando houver garantias parciais, isto é, quando cobrirem só metade, por exemplo, do valor do empréstimo, o "prejuízo" deve ser lançado após seis meses. Mesmo quando não houver garantia nenhuma, o débito deve ser considerado como prejuízo somente após 60 dias de atraso.
O que a equipe FHC fez? Ordenou que o BB lançasse como prejuízo, imediatamente, até mesmo os créditos que nem sequer estão vencidos -mas que a direção do BB (subordinada à equipe FHC/BNDES) considere como difíceis de receber. Valor desses créditos: R$ 5 bilhões. Daí o prejuízo. Inventado.
O cerco
O "socorro" ao BB se resume, na verdade, a aumentar capital para enquadrá-lo em regras fixadas por acordos internacionais. E o governo não lhe entregou "dinheiro vivo", que permitiria ampliar negócios -e lucros. "Pagou" em títulos. Moedas podres.
O calote
Dos R$ 8 bilhões (em títulos), uma fatia de R$ 1,5 bilhão se destinou ao pagamento de dívidas (títulos da dívida externa) que o governo tinha há muito tempo com o BB. Vencidas e não-pagas.
Calote duplo
O BB tem, ainda, outro R$ 1,7 bilhão de títulos do governo também vencidos, que já deveriam ter sido pagos. De onde vieram? Faziam parte do patrimônio de empresas estatais dos quais o BB era acionistas.
Elas foram privatizadas -mas, como sempre, os compradores não ficaram com esses títulos. Podres. Por decisão da equipe econômica da época, o BB ficou com eles -e o seu valor, é óbvio, foi descontado do preço da estatal.
Invencionice
Bastaria que o governo tivesse pago essas duas dívidas, que somam R$ 3,2 bilhões, e o prejuízo de R$ 4,2 bilhões do BB em 95 teria caído para R$ 1 bilhão. E nem se fala, aqui, de outras dívidas do Tesouro para com o BB. Se fossem pagas, o prejuízo teria virado lucro.

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