São Paulo, domingo, 7 de julho de 1996
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Uma grande empreitada

JANIO DE FREITAS

Talvez fosse o novo mistério de PC Farias, talvez algum constrangimento, o certo é que só um motivo forte impediu que chegassem à superfície, com a evidência merecida, duas graves acusações que atingiram em cheio a pretendida moralidade do governo: corrupção eleitoral e corrupção sem adjetivo.
Não estão circunscritos a um ou outro caso isolado, como o governo tenta alegar, os privilégios eleitoreiros dados a prefeitos e parlamentares-candidatos do PSDB, para os quais são liberadas verbas orçamentárias que não chegam às de outros partidos, nem mesmo às do ultragovernista PFL.
É inverdadeiro, também, que só verbas do Fundo Nacional de Saúde tenham servido ao favorecimento. Há muito dinheiro e diferentes fontes governamentais na empreitada eleitoreira.
O Ministério do Planejamento está sendo explicitamente acusado, por vários prefeitos, da prática de jogo político na liberação de verbas orçamentárias. O que não chega a surpreender, porque já no início do ano, quando da discriminação dos recursos financeiros para 96, o então ministro, José Serra, foi acusado de favorecimento a municípios de São Paulo. Até sair do governo, teve que voltar ao tema inúmeras vezes, buscando desmontar a acusação. Se obteve algum êxito, foi inexpressivo.
Um aspecto peculiar na dificuldade em que fica o Ministério do Planejamento com a denúncia de suas práticas eleitoreiras, é que não começou na oposição o empenho em dar consequência política ao caso. Começou no próprio governo, por iniciativa de representantes paulistas do PMDB e do PPB, que vêem, nas consequências paulistanas da denúncia, a compensação pelas ursadas peessedebistas de que se sentem vítimas. As artimanhas eleitoreiras do PSDB ameaçam tornar-se derroteiras.
Também pelo começo do ano, o Comunidade Solidária ficou suspeito de praticar favorecimento na distribuição de verbas, com a mesma destinação paulista. O Comunidade, não custa lembrar, substituiu a prestação direta de serviços, como fazia (em termos) a LBA, pela entrega das verbas às prefeituras e entidades. A idéia era livrar-se de acusações por ineficácia e de escândalos por mau uso do dinheiro.
Dezenas de ONGs, ou já centenas, orientadas para questões sociais, estão constituindo um movimento que começa por pedir a dissolução do Comunidade Solidária, admitindo chegar a uma campanha nacional com tal fim. O sistema financeiro do Comunidade Solidária é acusado de transformar verbas sociais em dinheiro de finalidades eleitoreiras.
O outro gênero de corrupção denunciado alcança também o Ministério do Planejamento. Trata-se da cobrança, a governos estaduais e prefeituras, de comissões para liberar verbas que lhes cabem. Também neste caso, vários prefeitos fazem a acusação.
O esquema PC-Collor foi de grande eficiência nesse método. Se alguma dívida gordinha do governo foi paga, naqueles anos, sem que uma parte entrasse no caixa do esquema, o empresário isento foi objeto de um milagre. Mas PC e sua equipe preferiam agir sobre o empresariado. Os precursores da comissão de prefeituras e Estados foram outros.
É provável que Dilson Funaro tenha morrido sem saber, e que alguns assessores seus não saibam ainda, que vários prefeitos precisaram pagar comissão, nem que fosse em prestações, para rolar as dívidas de suas prefeituras ou regularizar condições para obter dinheiro. O pagamento da comissão, a pretexto de imaginários serviços prestados, era feito a um suposto escritório de consultoria econômica, registrado e instalado em S.Paulo. Um contrato com o tal escritório, paralelo a um acerto de contas com o governo federal, ficou no meio da documentação oficial assinada, em Maceió, pelo então político provinciano Fernando Collor.
Confrontado com as denúncias de agora, o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Andrea Calabi (por acaso, secretário do Tesouro com Funaro), exaltou-se: "Que materializem as denúncias! Chamo até a polícia!" A hipótese é interessante, mas Calabi talvez não se lembre de quanto as investigações, desde o esquema PC-Collor, têm sido surpreendentes, em um sentido ou em outro.

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