São Paulo, domingo, 7 de julho de 1996
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A trágica herança do governo FHC

ALOYSIO BIONDI

O presidente Fernando Henrique se auto-proclama condutor implacável de grandes transformações no país. Inflamados, FHC e seus acólitos dizem que os críticos são incapazes de entender que o desemprego e a quebra de empresas são fenômenos passageiros, e apenas um preço, "até barato", que o Brasil está pagando para chegar à modernização e virar uma potência mundial.
Falta aos críticos -diz FHC- uma visão de longo prazo, capacidade de entender o "processo histórico". É a verdade pelo avesso. Quem se deslumbra com êxitos passageiros, como "enxurrada de dólares" ou consumo de frango, são o presidente e seus vassalos. Não avaliam a herança maldita que estão deixando para a sociedade. Estão promovendo transformações inacreditáveis, sim, com sua política de "terra arrasada", que há dois anos vem criando dois Brasis.
De um lado, empresários brasileiros médios, pequenos ou micro arruinados, destruídos. Junto com eles, classe média e povão desempregados e empobrecidos. No outro Brasil, da equipe FHC/BNDES, os "donos do Brasil", privilegiados e presenteados com favores e até com o patrimônio que era coletivo. Basta dissecar notícias dos últimos 15 dias para entender o que está acontecendo.
* Empresários - As vendas de TV e eletroeletrônicos explodiram neste ano. Em maio, cresceram 55%. Prosperidade? Não. As empresas médias, fabricantes das peças e componentes, venderam 13% a menos em maio. Razão da contradição? Facilidades para importar.
A mesma coisa que aconteceu com a indústria de autopeças: as fábricas de carros triplicaram a importação de componentes, de dois anos para cá. Pagam só 2% de imposto nessas importações. As filiais "preferem" importar das matrizes. É essa a política industrial do governo FHC. Quebra para o empresário nacional. Desemprego para a classe média e povão.
* Juros - Pouco lembrado: as grandes empresas e as multinacionais conseguem empréstimos no exterior a juros de 8% ao ano. Podem ter fôlego para enfrentar a recessão. As empresas nacionais médias (sem falar nas pequenas e micros) pagam os mesmos 8%. Por mês. Quebram. É a política FHC/BNDES.
* Quem leva - Todos os dias, notícias de vendas de empresas. Segundo a Price & Waterhouse, as multinacionais aparecem como compradores em 50% das operações de venda total.
* Quem perde - Além da venda total, há as "associações", nas quais o comprador paga apenas 10% a 20% do valor da empresa -para assumir seu controle. Em 80% das associações, 8 em cada 10, as múltis engoliram o antigo dono.
* Dólares - A "enxurrada", portanto, não é para investir, criar produção e empregos. Mas para múltis comprarem empresas existentes -e abocanharem o mercado. A 20%.
* Povão - Condenado a salários menores e ao desemprego permanente, por falta de uma política industrial, agrícola e de absorção de mão-de-obra.
* Consumidor - A renda do consumidor está sendo confiscada, com juros de 10% ao mês no crediário (povão) e cartões ou cheques especiais (classe média). Os bancos se locupletam.
Esse o verdadeiro balanço do Plano Real. A melhora do poder aquisitivo do brasileiro foi um fenômeno passageiro, com a queda da inflação. O futuro do Brasil, desenhado acima, é bem diferente. Enriquecimento para poucos grupos empresariais e banqueiros, que se apoderam de parcela cada vez maior da riqueza nacional, junto com as multinacionais. Para o "resto" do povo brasileiro -empresários, classe média e povão-, ficam a quebradeira, perda de patrimônio, desemprego, miséria e dependência externa.

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