São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 1996
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Brasil, mostra a tua cara!

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

"Não me convidaram / Pra essa festa pobre / Que os homens armaram / Pra me convencer / A pagar sem ver / Toda essa droga / Que já vem malhada / Antes d'eu nascer."
(Cazuza - "Brasil")

Nos últimos dias, a imprensa voltou a fazer graves revelações sobre a crise bancária no Brasil.
Graças a um vazamento, ficamos sabendo que o relatório definitivo da comissão de inquérito do Banco Central (BC), já encaminhado à Justiça, reestimou para nada menos que R$ 7,6 bilhões o desequilíbrio patrimonial do Banco Nacional.
Descobriu-se, também, que o total de recursos públicos desembolsados para viabilizar a absorção do Banco Econômico pelo Excel alcançou R$ 6,2 bilhões.
Outros bancos privados de peso estariam pendurados no redesconto do BC ou dependendo de socorro do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal.
A cada dia que passa, aumenta a conta decorrente da socialização de prejuízos bancários em curso desde o ano passado.
Desmentidos e declarações tranquilizadoras não produzem mais efeito. Os acontecimentos dos últimos meses abalaram profundamente a credibilidade do BC, das firmas de auditoria e de muitos bancos.
O mais ingênuo dos brasileiros já percebe, a esta altura, que os negócios bancários no país obedecem a procedimentos e critérios estranhíssimos.
Quem não se recorda, por exemplo, da performance da KPMG, empresa que auditava as contas do Nacional?
Poucos dias antes do colapso de um banco que praticava, havia anos, fraudes em escala monumental, a KPMG emitiu relatório que não apontava nenhuma irregularidade. Alguns dias depois da intervenção do BC, um dos sócios dessa empresa de auditoria chegou a declarar à "Gazeta Mercantil" que o Nacional "não possuía desequilíbrio patrimonial"!
"Um médico pode fazer exames e atestar que você está bem. Mas nada impede que você tenha um ataque cardíaco no dia seguinte", explicou.
E ainda acrescentou: "O auditor analisa os dados pressupondo (sic) que o banco está operando normalmente."
Mas, se o pressuposto é que o banco está operando normalmente, para que serve o atestado do auditor?
Ainda mais curiosas foram as declarações de Eduardo de Magalhães Pinto, na mesma época, também publicadas pela "Gazeta Mercantil": "Não podem nos acusar de nada. Estamos com a honra intocada. Foi maravilhoso (sic) durante dez anos, mas acabou."
Depois do que veio à tona nos últimos meses, tudo isso soa como o mais puro deboche. Seria cômico, se a farsa não estivesse sendo custeada com recursos públicos.
Entre novembro de 95 e maio de 96, as liberações brutas do Proer (Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional) chegaram a R$ 12,1 bilhões, segundo dados divulgados pelo BC. Deduzidos os valores quitados junto ao BC, o desembolso líquido foi de R$ 8,4 bilhões até maio.
Em apenas três meses, de março a maio de 96, as operações de assistência financeira de liquidez do BC (Proer e outras) produziram impacto líquido de nada menos que R$ 5,5 bilhões, com ampliação correspondente da dívida mobiliária federal.
Desde então, já houve novas liberações no âmbito do Proer. Segundo apurou a Sucursal de Brasília da Folha, com essas operações mais recentes, o desembolso bruto do Proer soma até agora cerca de R$ 13,3 bilhões.
É como disse o Macaco Simão: depois do Nacional e do Econômico, o caso PC Farias teria que ter sido remetido a um tribunal de pequenas causas!

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