São Paulo, sexta-feira, 12 de julho de 1996
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Classe média agora toca baião, xaxado e xote

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

Houve um tempo em que jovens universitários, filhos da classe média urbana, se reuniam para tocar rock. Hoje, estão formando bandas de forró.
O fenômeno já despertou a atenção das gravadoras. A Roadrunner -multinacional de origem holandesa que se firmou no Brasil editando álbuns de "trash metal", como os do Sepultura e Ratos de Porão- criou um selo para abrigar a nova tendência.
É o Discos Original (assim mesmo, tropeçando no português). A gravadora o inaugurou com o Jambêndola, quinteto paulista formado por egressos da Unicamp.
O CD que leva o nome do grupo chegou às lojas em março, mas somente agora desponta na mídia.
A rádio Enseada (da Baixada Santista), a Eldorado (de São Paulo), a Atlântida (de Porto Alegre) e outras FMs do país começaram a tocar faixas do álbum. Programas de televisão -como o "Ana Maria Braga", na Record, e o "Metrópolis", na Cultura- também abriram espaço para a banda.
Amanhã, a MTV exibe o primeiro clipe do Jambêndola durante o "Território Nacional", que começa às 20h. Dirigido por Alê Primo, o vídeo ilustra o "Forró de Mané Vito", clássico de Luiz Gonzaga e Zé Dantas.
"Severina Cooper"
Outro grupo -Os Sobrinhos de Tia Malúdica- acaba de gravar um CD independente e o negocia com a Roadrunner, a Paradoxx e a Tinitus. A banda é composta por quatro cariocas e um cearense, ex-estudantes de química, engenharia e jornalismo.
No disco, batizado de "Cangalha Urbana", fazem uma releitura de "Severina Cooper", forró "cult" de Acioly Neto.
Nem a rapaziada do Distrito Federal, célebre pelos conjuntos de rock que fundou durante os anos 80, escapa da onda.
O grupo Os Cachorros das Cachorras, que saiu da Universidade de Brasília, emplacou um "hit" na Cultura FM local. É "Discoteque no Forró", colcha de retalhos que agrega músicas de Gonzagão, Anastácia e Elba Ramalho.
Os seis integrantes da banda -Kaphagérson, Alfredog Soriano, Toronto Viramundo, Zimbatera, Kelsyn Nayara e Cobrinha- explicam que o nome Os Cachorros das Cachorras não homenageia apenas "mães e fãs". Também reverencia o Coronel Ludugero.
O forrozeiro nordestino gravou, há três décadas, um disco em que narra a história de um amigo compositor. O personagem da música, num dia de maus bofes, cometeu o repente intitulado "O Cachorro da Cachorra do Cachorro".
Gil e Alceu
Engana-se quem pensa que as bandas de forró seguem o rastro dos Raimundos e de Jorge Cabeleira. Estes tocam rock pesado com citações de baião, xaxado e xote.
Jambêndola & cia. trilham o caminho inverso. Privilegiam o ritmo nordestino, usam triângulo, zabumba e sanfona, mas não abandonam a guitarra, o baixo elétrico e a bateria.
Fazem o que a Roadrunner chama de "forrock pra pular brasileiro". São herdeiros de experimentações que Gilberto Gil, Alceu Valença, Zé Ramalho, Raul Seixas e Geraldo Azevedo promoveram nos anos 70 e 80.
São, ainda, produto direto de outro fenômeno recente: a descoberta, pela classe média, dos bailes de forró.
Duas bandas paulistas -a Gê! e a Mafuá- contam que, quando surgiram, priorizavam o samba. Só enveredaram pelo "som arretado" porque perceberam que o ritmo caíra no gosto dos jovens.
O Centro de Tradições Nordestinas, em São Paulo, não se espanta com o interesse dos "meninos". "A influência do rock é muito bem-vinda", afirma Tony Fernandes, coordenador do CTN.
Ele lembra que, desde 1993, o forró tradicional passa por um processo de modernização. "Os próprios nordestinos formaram grupos de xote e baião que, embora sem aderir à pegada roqueira, empregam instrumentos eletrônicos." É o caso do Calango Aceso e do Mastruz com Leite.
"O forró já se incorporou à paisagem das metrópoles", diz Marcos Mendonça, da Mafuá. "Jovens urbanos podem, portanto, tocá-lo com muita naturalidade."

Show: Jambêndola e Banda Gê!
Quando: 23 de julho, às 22h30
Onde: Blen Blen Club (rua Cardeal Arcoverde, 2.978, Pinheiros, zona oeste de São Paulo, tel. 011/815-4999)
Quanto: R$ 12 (estudante paga meia)

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