São Paulo, terça-feira, 16 de julho de 1996
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A CPMF e o "possível"

FERNANDO RODRIGUES

Brasília - Um axioma discutível une o presidente da República, parlamentares no Congresso e muitas outras pessoas. Eles dizem, frequentemente, que a política é a arte do possível.
Se é possível, o governo faz. Mas nem sempre é possível. Então, o governo não faz.
A CPMF, o imposto do cheque para a saúde, é um exemplo do que era impossível. Mas acabou possível. Isso depois de 40 minutos de conversa entre FHC e seus líderes no Congresso.
Só que a ladainha continua. "Faltou tempo para coisa melhor", ou "fizemos o que foi possível", dizem.
Por conta desse raciocínio reducionista, oportunidades se perdem.
O regime militar teve a longevidade que teve por causa dessa resignação com "o possível" -uma postura eternizada por Ulysses Guimarães.
A eleição presidencial em 85 foi indireta porque a maioria se contentou com o possível Tancredo Neves.
Mais recentemente, em 94, a Constituição poderia ter sido reformada. Não foi. Logo surgia um deputado ou um senador com a reveladora frase da unidade nacional: "Calma, meu filho. A política é a arte do possível".
"Possível", bem entendido, é sempre aquilo que ajuda -ou não prejudica- o projeto político dos detentores do poder.
Por exemplo, para FHC é importantíssimo eliminar a imagem de benfeitor de banqueiros. Ou, pior, de algoz de doentes e de hospitais públicos.
Assim, a CPMF atende aos anseios presidenciais. Não importa que o imposto seja ruim. Não importa se ainda houver tempo para uma ampla reforma tributária mais duradoura.
Não, nada disso importa. Uma reforma definitiva não é possível. O que conta é a imagem do governo. E, nesse caso, a emoção ajuda muito a demagogia de FHC, Jatene e parlamentares.
Já até criaram um selo: ser contra a CPMF é adotar raciocínio ligeiro e insensível. Hoje, só o imposto do cheque é "possível". É assim que se pensa e se faz pequeno neste país. Talvez só isso seja possível.
Mesmo assim, sou contra.

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