São Paulo, quarta-feira, 17 de julho de 1996
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Alô, herdeiros! Vão trabalhar, vagabundos!

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

No último dia 4, Carlos Heitor Cony comentou em sua coluna nesta Folha a absurda decisão da Justiça de manter a proibição da biografia de Garrincha, "Estrela Solitária - Um Brasileiro Chamado Garrincha", perpetrada com maestria por meu amigo do peito, o jornalista e escritor Ruy Castro.
A Justiça entendeu que o livro prejudica a honra da família. Na minha modestíssima opinião, o buraco é mais embaixo. Depois de colaborarem para a feição do livro com horas de conversa, os familiares de Garrincha tentaram, em vão, levar uma porcentagem nas vendas. E o resultado é esse perigoso precedente sobre a liberdade de informação.
Agora, outro episódio vem macular o artigo 5º da Constituição, que assegura o livre direito de expressão. O fato chega ao meu conhecimento por intermédio de um leitor que vive plugado na Internet: a estudante Micheline Barroso se encontra, segundo ela mesma, "impossibilitada de expressar admiração pelo poeta Vinicius de Moraes".
Eu explico: a fim de prestar uma homenagem ao ídolo "por amor" e para que usuários da Internet pudessem "redescobrir e dar o devido valor a Vinicius", ela resolveu colocar na rede, sem fins lucrativos, uma página com uma pequena biografia, letras de música, enfim, um simpático tour pela vida do homem que as feias perdoavam com o maior prazer.
Pois não é que os herdeiros de Vinicius, que também preparam uma página sobre o parente ilustre (definida por eles como "oficial"), acharam por bem negar, por meio de advogados, permissão para que a garota faça sua homenagem?
Se estivesse vivo, Vinicius aplaudiria o impecável CD-ROM "Viva Vinicius", uma coletânea de poesias, músicas etc., que sua família acaba de lançar. Mas o que diria ele sobre essa atitude gananciosa contra a estudante?
Que eu saiba, a Lei dos Direitos Autorais serve para impedir que terceiros lucrem sobre a obra do autor. O que não se aplica a esse caso.
A proibição fere, sobretudo, o espírito da Internet.
A família de Vinicius talvez não saiba, mas, em lugares onde a discussão sobre o uso da Internet anda bem mais avançada do que aqui, esse babado de proibição inexiste. Dias atrás, o presidente Clinton assinou decreto banindo qualquer censura à rede nos EUA.

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