São Paulo, quarta-feira, 17 de julho de 1996
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A CPMF e a área econômica

LUÍS NASSIF

Ontem, na Folha, economista ligado ao Real -hoje fora do governo- repisa os seguintes argumentos, a respeito do debate sobre a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira): o imposto é ruim; toda a equipe econômica estava contra; mesmo assim, o presidente o apoiou. Deve haver alguma razão misteriosa para tal atitude.
Embora não seja argumento relevante para certo tipo de pensamento tecnocrático, talvez fosse o caso de considerar que uma das razões poderia ter sido a de evitar que centenas de milhares de brasileiros ficassem sem atendimento médico de emergência. Quem sabe? Tudo é possível.
Há uma grande confusão sobre o papel a ser exercido por equipes econômicas. Em nenhuma empresa as prioridades são fixadas pelo diretor financeiro. Se um investimento é fundamental para a companhia, o papel do financeiro é tratar de financiá-lo da forma mais barata e saudável possível.
Mas não é ele quem define prioridades. Se se fosse deixar por sua conta, a única prioridade seria o caixa, e a empresa perderia completamente seu foco estratégico.
Nas últimas décadas, um dos maiores vícios da política econômica brasileira foi conferir ao pensamento financeiro tecnocrático o poder absoluto de definir prioridades, independentemente das consequências sobre os demais departamentos da companhia Brasil.
A legitimação desse poder arbitrário foi dada pelo apoio de parte da opinião pública especializada, que, sem dispor de visão mais abrangente sobre os demais departamentos da empresa Brasil, como economia real, política industrial, política de emprego e políticas sociais, passou a tratar a gestão financeira como fim em si mesmo. E a considerar como virtuosa toda e qualquer decisão de política econômica, independentemente de análise mais crítica.
Com tão poucas resistências, foi uma festa para sucessivos gestores financeiros. Qualquer problema que tivessem de enfrentar, lixavam-se para as consequências. Resolviam seu problema e o país e as demais áreas que explodissem.
O caso da política de juros e câmbio do ano passado é significativo. Hoje em dia, não deve haver um só economista de renome que não classifique de equivocada a política monetária do ano passado.
No entanto, tomem-se os principais críticos da CPMF, os tais defensores da "racionalidade econômica" da área financeira, e confira-se o que escreveram na época. Qual sua relação ao fato de ter aumentado em US$ 60 bilhões a dívida mobiliária, de terem quebrado agricultura, pequeno comércio e indústria?
Apoio absoluto, em cima da fé cega e da faca amolada sobre os investimentos prioritários.
A equipe econômica está aí para atender às prioridades do governo e do país. E a prioridade é impedir uma crise na saúde pública. Se a CPMF é uma má solução (e é), seu papel é encontrar solução melhor, no mais rápido espaço de tempo. E não compartilhar dessa visão escandalosamente irresponsável de diversos analistas de deixar a saúde ao deus-dará. É para isso que são indicados e pagos.
Pingue
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) entra em contato com a coluna para explicar as razões que o fizeram ser um dos líderes do PT contra a CPMF.
Sustenta que há um ano e meio existe o problema da saúde e o governo nada fez para resolvê-lo. Diz que a questão da saúde é tão relevante que não se pode depender apenas de um imposto provisório e de arrecadação incerta.
Como médico, diz ser a favor do SUS. Mas foi informado de que o orçamento da saúde para este ano sofreu cortes de US$ 1,8 bilhão, quantia que lhe teria sido confirmada pelo próprio ministro Adib Jatene. Finalmente, sustenta que impostos podem ser direcionados, e ninguém garante que os recursos da CPMF irão efetivamente para a saúde. Não explicou como tratar a questão emergencial da crise do SUS.
Pongue
O deputado José Genoino (PT-SP) entra em contato para informar que pedirá a transcrição da coluna de sexta nos anais da Câmara. Diz que a disputa política com o governo não pode servir de motivo para colocar em risco a saúde da população mais necessitada.

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