São Paulo, sábado, 20 de julho de 1996
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Hábito rejeitado socialmente

JAQUELINE SCHOLZ ISSA

Obviamente, a proibição do fumo em lugares fechados não será o único fator determinante na decisão de abandonar o tabagismo, mas, com certeza, fará com que os fumantes percebam, de forma crítica, que o tabagismo não é mais um hábito socialmente aceito ou mesmo recomendável.
Além disso, revelará para a imensa maioria dos fumantes a escravidão imposta pelo cigarro. O que supostamente é encarado como um hábito ou uma opção se apresentará como uma necessidade incômoda e incontrolável de fumar, determinada pela dependência química ao cigarro.
A nicotina é a principal substância responsável pela dependência química. Ao atingir o cérebro, geralmente sete segundos após a tragada, atua principalmente no sistema mesolímbico, provocando liberação de substâncias psicoativas e hormonais, responsáveis pelas sensações prazerosas.
Os receptores cerebrais que reconhecem a nicotina exigem, com o tempo, quantidades cada vez maiores da droga para dar o mesmo nível de resposta.
Características como efeito psicoativo, necessidades de doses progressivamente maiores para obtenção dos mesmos efeitos, uso compulsivo e recaídas frequentes nos indivíduos que tentam interromper o tabagismo permitiram à Associação Americana de Psiquiatria, dos EUA, classificar a nicotina como droga causadora de dependência física semelhante a outras drogas, como cocaína e heroína.
É essa dependência que faz com que os fumantes tomem atitudes bizarras como: procurar pontas de cigarros nos cinzeiros quando o cigarro acaba; interromper uma sessão de cinema ou de teatro para fumar; continuar fumando mesmo quando acometido por doenças que atacam as vias aéreas ou colocam suas vidas em risco; mostrar-se incapaz de realizar trabalho intelectual quando privado do cigarro.
Graças ao descobrimento dessa dependência, houve uma melhora da eficiência do abandono do tabagismo pelo uso de nicotina em preparações farmacológicas.
A restrição do fumo em locais fechados tem como objetivo principal proteger os não-fumantes da exposição à fumaça do cigarro (fumante passivo). A Agência Americana de Proteção Ambiental, dos EUA, em 1986, reconheceu a fumaça do cigarro como substância cancerígena e também como o mais importante poluente dos ambientes fechados. Nos EUA, admite-se que anualmente morram 50 mil pessoas em consequência do fumo passivo.
Na minha opinião, a restrição ao fumo possibilitará ao fumante reconhecer o regime de escravidão que o cigarro lhe impõe, e esta condição, sim, poderá ser um importante fator adicional de incentivo aos já conhecidos benefícios que a interrupção do tabagismo proporciona à saúde física, psíquica, ambiental e econômica. Afinal, a maior riqueza do ser humano é a sua verdadeira liberdade.

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