São Paulo, quinta-feira, 25 de julho de 1996
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Uma dura vitória

JANIO DE FREITAS

É pena, mas o que se passou em torno da CPMF, nos quase dois anos de luta do ministro Adib Jatene para vê-la aprovada, não escapará ao destino dos acontecimentos brasileiros: o desinteresse dos historiadores, dos sociólogos e congêneres. O esquecimento só não será total porque um ou outro aspecto das aparências sobreviverá, como sempre, em algumas memórias. Aspectos da aparência construída para encobrir ou disfarçar as realidades.
O levantamento das tramas, cenas, armadilhas, pressões, mesquinharias individuais, aprontadas contra a CPMF até a aprovação se tornar inevitável, dariam um retrato fantástico da gente e do modo de governar o Brasil. E tão mais expressivo quanto a CPMF não é uma questão grandiosa, mas um desconto insignificante de certos movimentos financeiros e por prazo, além de limitado, curto.
O Brasil é mesmo um país doente: conduzido pelo que há de doentio na política.
Em sequência
Primeiro foi a compra de um prédio no Rio, junto ao Hospital da Aeronáutica, por preço que algumas avaliações consideravam muito acima do valor de mercado. A Aeronáutica obteve do Tribunal de Contas da União um parecer que sepultou o escândalo, mas fantasma do negócio ficou zanzando por aí, vivinho nas memórias.
Depois foi a multidão de ilegalidades e imoralidades que transformaram o projeto Sivam em ação entre amigos da Aeronáutica, para enfim doá-lo, burlando a exigência legal de licitação, à empresa Raytheon. De tão grande, o escândalo não pôde ser sepultado na cova que os governistas lhe prepararam no Senado. Teve que ser enfiado à força numa gaveta do presidente da comissão senatorial, Antônio Carlos Magalhães. Agradecido, o chefe do governo mandou o Banco Central resolver, a qualquer custo, o caso do Banco Econômico.
Agora, um anúncio classificado no jornal "Zero Hora", de Porto Alegre, antecipou o resultado de uma concorrência feita pela Infraero. O edital, por si só, já valia como denúncia de vícios na concorrência, tamanhas as restrições que limitaram o número de concorrentes. Um mês antes da definição do vencedor, o deputado Augusto Carvalho pediu a atenção do Tribunal de Contas para o edital.
Os preços oferecidos à Infraero, para serviços de manutenção no Aeroporto de Brasília por dois anos, ficaram todos acima do teto de R$ 1,2 milhão, fixado pelo edital. Coincidência, é claro. Embora esta, somada à antecipação do vencedor e a outras coincidências, faça concluir que houve de tudo no caso, menos coincidência e concorrência.
Nem no céu há mais anjinho.
Novos assaltos
Para os aluguéis não houve Plano Real nem, muito menos, queda da inflação. Foi isso mesmo que quiseram os autores e os aplicadores do plano, deixando os aluguéis isentos de qualquer atenção honesta de todos eles.
Os índices de aumento variam de cidade para cidade, mas, tomando-se um dado de São Paulo para o primeiro ano do real, os aluguéis subiram 210%, enquanto a inflação acumulou 54%. Ao se completar há pouco o segundo ano do real, as referências ao aumento acumulado dos aluguéis ficaram entre 360% e 410%.
Neste mês começou nova onda de aumentos. Como das vezes anteriores, os índices de inflação terão o recato de não os refletir. E o pessoal do governo não terá o recato de colher os frutos dos aumentos assaltantes.

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