São Paulo, domingo, 11 de agosto de 1996
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As crises bancárias

CELSO PINTO

Dezenas de países passaram por crises bancárias recentes, muitos na América Latina, inclusive o Brasil, algumas com efeitos desastrosos. Que lições elas deixaram?
Vários trabalhos e discussões, em uma semana do encontro da Sociedade Econométrica, no Rio, trataram da questão, com muitas dúvidas e algumas soluções. Alguns exemplos:
1) Como regular os bancos? Peter Garber, da Brown University, nos Estados Unidos, especialista na análise de ataques especulativos contra moedas, mostrou como é pantanoso esse terreno.
A crise do México em 94 foi vista, de início, como um desastre provocado por investidores ávidos e mal informados em Wall Street. Os bancos mexicanos estavam submetidos a duras regras de controle sobre endividamento em dólares, comprometimento por instituição etc.
Garber mostrou três exemplos de como essas regras foram largamente desrespeitadas: pelo uso de "swaps" (trocas) de Tesobonos (títulos mexicanos denominados em dólares) e de ações com bancos estrangeiros e pela compra de "notas estruturais".
Os "swaps" apareceram contabilmente como aquisições de Tesobonos e ações mexicanas por bancos internacionais. Na verdade, foram uma forma de financiamento em dólares para os próprios bancos mexicanos comprarem títulos e ações em seu país fugindo dos controles.
As notas estruturais eram títulos em dólares, mas cuja remuneração estava ligada à variação do peso: se ele se desvalorizasse, ela podia ir a zero. Aparecia como dívida em dólar, mas era uma forma de os bancos mexicanos aplicarem em pesos e ganharem com a diferença de juros.
Eram operações legais, mas que serviam para evadir controles -algo muito comum no Brasil. O efeito foi que, quando os problemas surgiram, os bancos mexicanos correram para cobrir posições em dólares agravando a crise cambial. Os bancos e o país saíram quebrados.
Garber é cético sobre as chances de controlar os bancos. "Só se se investir numa estrutura muito forte, eficiente e capaz de controlar também operações dos bancos em paraísos fiscais", diz ele.
2) Qual a origem das crises e como evitá-las? Carmen Reinhart, do FMI, estudou 76 episódios de crises cambiais e 26 de crises bancárias, em 20 países. Na origem das crises bancárias sempre está um "boom" de crédito, muitas vezes provocado pela ânsia de liberalizar o setor financeiro sem antes ter uma supervisão adequada.
Crédito fácil leva os bancos a descuidar da qualidade dos tomadores, lembra Ricardo Hausmann, economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Depois dos excessos, diz Reinhart, vem a sobrevalorização do câmbio, buracos nas contas externas, juros altos e recessão. Em algum momento caem as bolsas e o mercado imobiliário.
Vem a crise bancária primeiro e, depois, a crise de balanço de pagamentos. Para evitar que se chegue a isso, portanto, seria preciso cortar as chances de se ter uma crise bancária, contendo o "boom" de crédito sem exagerar nos juros altos.
Hausmann diz que, no caso da América Latina, a situação é mais grave porque os mercados são mais voláteis. Por essa razão, ele recomenda que os bancos na região sejam obrigados a ter mais capital do que a média e mais liquidez.
Uma forma de dar liquidez é o BC recolher depósitos compulsórios sobre os depósitos bancários, como faz o Brasil. Cria-se um "colchão" de liquidez para o momento de crise.
No entanto, na hora de liberar os compulsórios, como no caso do Proer (programa de ajuda aos bancos), o governo está, de todo modo, criando crédito, com efeitos potencialmente inflacionários. Daí porque é preciso gerar fortes superávits fiscais nas contas do governo, como fez o México, para financiar sem problemas o programa de ajuda aos bancos. "O problema do Brasil é ter uma política fiscal débil", constata Hausmann.
3) E se a crise chegar? Esse é o terreno mais escorregadio. "A estabilidade dos bancos é um bem público", argumenta Manuel Guitián, do FMI. Se os governos simplesmente ajudarem os bancos sem limites, contudo, estimularão a especulação e o mau comportamento.
O ideal é evitar que se chegue à crise. Mas isso, como se viu, é mais fácil de falar do que fazer.

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