São Paulo, domingo, 11 de agosto de 1996
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Os relâmpagos na 'floresta da chuva'

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Chuvas, raios e trovões são a marca registrada da floresta Amazônica -tanto que os pesquisadores americanos preferem chamá-la de "rain forest", floresta pluvial.
Apesar disso, só agora uma equipe de cientistas brasileiros e americanos vai estudar um dos efeitos mais visíveis, e menos conhecidos, do meio-ambiente amazônico: os relâmpagos.
Ninguém até hoje estudou esses relâmpagos. E para se ter uma idéia da dimensão do objeto de estudo, basta ver que, na maior parte do Brasil, nuvens de tempestade só acontecem em pouco mais de 50 dias a cada ano. Na Amazônia, há nuvens de tempestades em cerca de 150 dias, quase metade do ano.
"O objetivo do projeto na Amazônia é determinar as características dos relâmpagos nesta região. Considerando que os relâmpagos afetam o meio-ambiente local, isto é, o solo e a atmosfera, e considerando que a Amazônia é a maior floresta tropical do mundo, é importante estudar o efeito dos relâmpagos sobre esta região", disse à Folha o pesquisador brasileiro envolvido no estudo, Osmar Pinto Júnior, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
"Tal efeito pode ter um impacto sobre o meio-ambiente global de nosso planeta", acrescenta. E não é a só a Amazônia. Pouco se sabe sobre os raios na região equatorial do planeta, e a pesquisa vai ser a primeira a preencher essa lacuna.
Além disso, "o estudo das características dos relâmpagos em uma dada região permite conhecer melhor a geofísica do meio-ambiente e meteorologia da região, bem como é importante no aprimoramento das técnicas de proteção contra raios nesta região", diz.
Descargas elétricas
A equipe inclui pessoal do Inpe e das universidades americanas de Washington e Colorado.
Pinto Jr. e sua mulher, Iara R.C. de Almeida Pinto, são dois raros cientistas brasileiros que pesquisam os relâmpagos. Os dois escreveram um livro sobre o tema publicado este ano pela Editora Brasiliense (o título é, simplesmente, "Relâmpagos"). Osmar deve fazer uma palestra sobre o tema na Bienal do Livro em São Paulo, no próximo dia 23 às 19h00.
O que é um relâmpago? É simplesmente uma descarga elétrica que ocorre na atmosfera, seja da nuvem para o solo, do solo para a nuvem, dentro da nuvem, entre nuvens ou da nuvem para um ponto na atmosfera.
"Os raios iniciam onde o campo elétrico produzido pelas cargas dentro das nuvens e no solo consegue primeiro romper a capacidade isolante do ar. Isso ocorre geralmente dentro das nuvens, mas pode ocorrer a partir do solo, em geral do topo de altas torres ou árvores", diz o pesquisador do Inpe.
Balão sobre as nuvens
A pesquisa vai ser feita por meio de instrumentos a bordo de um balão e de um avião. O balão voará sobre as nuvens, cujo topo, na região, alcança em média 15 ou 16 km de altitude.
Um dos principais objetivos da pesquisa é detectar as misteriosas luzes sobre as nuvens conhecidas como "blue jets" ("jatos azuis"), e tentar descobrir o que gera o fenômeno, às vezes visto por pilotos de aviões comerciais.
"Os instrumentos no balão irão detectar o campo elétrico produzido pelos relâmpagos e a condutividade elétrica da atmosfera sobre as nuvens de tempestade. No avião, teremos câmeras de vídeo de alta sensibilidade para medidas ópticas", diz Pinto Jr.
Não se trata de um balão comum este que os americanos trarão: seu custo fica em torno de US$ 100 mil. Ele deverá ser lançado de Natal (RN) entre dezembro e março próximos (a idéia é fazer com que ventos que sopram para oeste nessa época do ano levem o balão sobre Amazônia, a uma velocidade de 50 km/h). Ainda não há uma data definida para o estudo.
Calcula-se que o balão vá oscilar em uma faixa de cerca de 5° de latitude acima ou abaixo de Natal. O balão, não tripulado, alcançará 26 km de altitude.
O avião -um Bandeirante- deverá seguir a trajetória do balão a cerca de 50 km de distância. Apesar de voar abaixo das nuvens, ele estará longe o suficiente para ter uma visão lateral da região que os instrumentos do balão checarão.
Se for deixado voar livremente, o balão dará a volta ao mundo em cerca de um mês. Os pesquisadores estão envolvidos em negociações com os outros países sobre os quais ele poderia voar.
Se forem bem sucedidas, é provável que uma segunda série de medições seja feita. Caso contrário, o balão terá de ser autodestruído ao chegar no oceano Pacífico.

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