São Paulo, domingo, 11 de agosto de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Samba do avião

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nos "anos dourados" do Carnaval carioca, os salões da então capital da República viviam infestados de personalidades do "jet set" internacional que voavam para cá num simples estalar de dedos.
Assim que o chamado "vôo das celebridades" via a água brilhando, olha a pista chegando, todos gritavam: Vamos nós. De praxe, tomavam um caju amigo com os membros do "Clube dos Cafajestes" e caiam na farra com as estrelas da casa: Rock Hudson "namorou" a maravilhosa Ilka Soares, Lana Turner abusou do lança perfume, Ava Gardner destruiu seu quarto no Hotel Glória e Jayne Mansfield perdeu o sutiã no baile do Copacabana Palace.
A televisão, vendo aquilo, achou melhor tirar uma casquinha. De cara chamou o frei José Mojica para seu show de estréia. E mesmo não podendo mostrar tudo que o famoso travesti Coccinelle tinha além de uma boa voz, entrou no circuito internacional, apresentando com rigor religioso pelo menos uma grande atração internacional por ano.
Brenda Lee veio no seu apogeu, mas os adolescentes locais, mais envolvidos com Cely e Tony Campello, não compareceram. A solução foi distribuir convites pelos colégios da cidade.
Rita Pavone chegou de madrugada, e soltou a voz no microfone de Ferreira Netto, acordando todo o hotel com seu grito de "viva la papa al pomodoro".
Caterina Valente cantava em 300 línguas e trocava de roupa com a mesma velocidade que Joan Crawford abria garrafas de Pepsi no programa de Hebe Camargo.
Maurice Chevalier mostrou que seu "Savoir Faire" era imbatível e Earl Grant virou freguês da TV Record.
Johnny Mathis sempre foi sucesso cantando para seu fiel público, embora muitos dissessem que, nos bastidores da TV Tupi, suas cantadas não eram exatamente dirigidas às garotas-propaganda.
Cris Montes foi uma decepção: tinha cabelos curtos e o figurino de um noviço, quando os reis do iê-iê-iê abusavam da cabeleira e das calças Lee americanas.
Os verdadeiros "reis do iê-iê-iê", os Beatles, nunca vieram, embora Paul McCartney viesse "solo" décadas depois em um show para a terceira idade, enquanto seus rivais, os Rolling Stones subiram no palco de cadeira de rodas.
Enquanto esse fluxo incessante de estrelas vinha, a maior estrela musical dos anos 60, Roberto Carlos, dava o troco faturando na Itália o festival de San Remo, cantando música de Sergio Endrigo, outro assíduo frequentador do Teatro Record.
Outra grande estrela da época, Brigitte Bardot, não saiu cantando sua versão francesa de "Maria Ninguém", mas os noticiários não cansavam de mostrar suas formas entrando e saindo de Gordinis último tipo a caminho de Búzios, ao mesmo tempo que a rota inversa levava Elis Regina para arrasar no Olimpya de Paris.
Aqui vai uma sugestão: porque não abrir os sarcófagos da televisão, passar uma flanela e exibir esses velhos shows?

Texto Anterior: Judoca troca batata por medalha em Sidney
Próximo Texto: Frio transforma provas do 'Domingo Legal' em tortura
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.