São Paulo, sábado, 17 de agosto de 1996
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Empregado doméstico

OCTAVIO BUENO MAGANO

Conhecido é o adágio: "Por fora bela viola, por dentro pão bolorento". Parece que é isso o que está acontecendo com o projeto de lei nº 41/91, recentemente aprovado no Senado Federal, a respeito de direitos trabalhistas outorgados a empregados domésticos.
Foi ele alardeado como extremamente benéfico à referida categoria de trabalhadores. Contudo, o exame de seu conteúdo mostra marcação de passo e excepcionalmente até mesmo regressão comparativamente ao direito atual.
A marcação de passo se detecta com a leitura do art. 3º do projeto, que apregoa serem direitos dos trabalhadores domésticos aqueles que já estavam previstos no parágrafo único do art. 7º, da Constituição, sem nenhum acréscimo. Vale dizer que os domésticos continuarão sem garantia de jornada de trabalho, sem direito a horas extras ou adicional noturno.
A falta de tais garantias, reveladora de discriminação injustificável do constituinte de 1988, contra os domésticos, não remediada pelo projeto, deixa estes nas mesmas condições aplicáveis no passado à negra Fulô, que podia ser chamada a qualquer hora do dia ou da noite para forrar a cama da sinhá ou para coçar suas coceiras.
Regressão encontra-se na alusão do parágrafo 1º, do art. 1º do projeto, à atividade de natureza contínua para a caracterização de relação empregatícia com doméstico, o que contraria a orientação jurisprudencial dominante sobre o assunto. Regressão se consubstancia ainda no art. 5º do projeto, ao dispor-se poder o empregado deduzir da remuneração do doméstico 6% e 3% a título, respectivamente, de moradia e de alimentação, quando, na prática, tais utilidades não costumam ser cobradas.
Mas, além disso, o projeto se ressente de outros vícios. Ao cuidar das faltas graves em que o doméstico pode incidir, excluiu a de ofensas físicas praticadas contra o empregador ou terceiros, o que se mostra totalmente injustificável.
Ao definir o doméstico, usou da língua de "volapuk". Muito mais claro ficaria o texto se nele se reproduzisse o conceito corrente de que empregado doméstico é a pessoa física que presta serviços de natureza não econômica, no âmbito residencial do empregador. E, assim definido o trabalhador doméstico, automaticamente se configuraria a condição de seu empregador, sem necessidade de que viesse este a ser também conceituado.
Por último, "last but not least", vem o disposto no artigo 7º do projeto, atribuindo ao empregado o direito ao recebimento de indenização, na hipótese de despedida indireta.
A regra só pode haver resultado de confusão, porque, se o empregado, nos termos do art. 8º do mesmo projeto, se insere no regime do FGTS, não faz sentido que fique, ademais, com direito à indenização. Mas se houvesse de ser aquinhoado com duplicação de benefícios, então a indenização haveria de ser também prevista para a hipótese de despedida direta. É de se esperar que o texto aprovado no Senado e, em via de ser remetido à Câmara dos Deputados, seja ali rejeitado.

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