São Paulo, sábado, 17 de agosto de 1996
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Joffily teatraliza a terceira morte de Pixote

AMIR LABAKI
DO ENVIADO ESPECIAL A GRAMADO

A história todos conhecem. Fernando Ramos da Silva, garoto pobre de Diadema, tornou-se uma celebridade em 1980 ao estrelar o drama sobre crianças de rua "Pixote, A Lei do Mais Fraco", de Hector Babenco.
A queda seria tão fulminante quanto a ascensão. Em 1987, depois de uma série de incidentes criminais, Fernando é morto por três policiais militares.
"Quem Matou Pixote?", de José Joffily ("A Maldição de Sanpaku"), propõe-se a ir muito além da reconstituição realista dessa tragédia muito brasileira. Seu filme enfrenta, de saída, dupla concorrência: a da força dos fatos e a da potência de um filme clássico.
Documentário
Joffily optou por um tratamento assumidamente artificial e antinaturalista. "Quem Matou Pixote?" muitas vezes parece um documentário sobre uma peça expressionista sobre o mesmo tema.
Contribuem para esse clima sobretudo a estilizada cenografia e a interpretação em geral um tom acima do elenco.
O choque inicial frente essa opção e a demora na plena engrenagem desses fatores causam forte desconforto.
Especialmente insatisfatório parece o recurso como cena de pontuação de Fernando, marcado para morrer, puxando "fumo" em um carro-museu em que chamas consomem fotos e artigos sobre sua carreira.
Frescor e intensidade
É só quando Luciana Rigueira ilumina a tela como Cida, o par perfeito para Fernando, que o jogo começa a mudar.
Mais até do que Cassiano Carneiro no papel central, deve-se a Rigueira os momentos de maior frescor e intensidade no filme todo.
A trama romântica revigora "Quem Matou Pixote?", quebrando a frieza e criando empatia. O filme continua contudo feito de altos (a família dançando ao som de "Emoções", em um solo sublime de Joana Fomm, como a mãe de Pixote) e baixos (a reconstituição excessivamente melô de uma tortura).
Romeu e Julieta
A vertente teatral torna-se auto-referente perto do fim, quando Cida e Fernando se despedem em um cenário tornado proscênio citando "Romeu e Julieta", de Shakespeare.
Uma potencial boa idéia surge plena em gratuidade, deslocada mesmo neste filme pautado por deslocamentos. A terceira morte de Pixote, reconheça-se, é a que menos emociona.
(AL)

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