São Paulo, quinta-feira, 29 de agosto de 1996
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O impacto do ICMS

CELSO PINTO

Todo o ICMS cobrado sobre o processo produtivo vai desaparecer a partir de 1998, quando ele se transformará num imposto exclusivo sobre os bens finais de consumo no país. Esse é talvez o aspecto mais importante do novo projeto do ICMS, embora tenha sido um dos menos comentados até agora.
O projeto é o empurrão mais forte dado até agora para a redução do chamado "custo Brasil", argumenta o ministro do Planejamento, Antonio Kandir. A eliminação do ICMS sobre exportações de produtos básicos e semi-manufaturados, na verdade, é apenas um aspecto do projeto e com um impacto imediato sobre o aumento das exportações tímido, como admite o próprio Kandir. Um banco calcula o aumento das exportações em pouco mais de US$ 1 bilhão em 97.
Outros aspectos do projeto são significativos e gerais. De um lado, isenta de ICMS, de imediato, os investimentos, compras para ativo fixo das indústrias e uso de energia elétrica. De outro, acaba com a taxação de ICMS em "cascata" sobre a produção a partir de 98.
O ICMS é um imposto, teoricamente, sobre o consumo. Na prática, vigora o regime de "crédito físico": uma indústria só pode se creditar contra gastos de ICMS embutidos em componentes físicos usados em seu produto. O novo projeto muda este regime para o de "crédito financeiro", ou seja, todo e qualquer gasto na produção que embuta o pagamento de ICMS dá direito a um crédito tributário. O ICMS será, de fato, um imposto sobre valor adicionado do tipo europeu.
O impacto desta medida é de R$ 2,3 bilhões no primeiro ano, mais do que o do fim do ICMS sobre exportação de básicos e semi-elaborados, de R$ 1,3 bilhão. No total, as perdas com ICMS estão estimadas em R$ 3,6 bilhões no primeiro ano e R$ 4,4 bilhões no segundo. Esta, portanto, será, grosso modo, a redução no custo de produção do país, algo como 1,5% do produto industrial, como lembra a assessoria econômica da Confederação Nacional da Indústria.
Ao reduzir o custo de produção, argumenta Kandir, a medida torna a economia mais competitiva, tanto para enfrentar a concorrência do importado, como para aumentar as exportações. A isenção de ICMS sobre investimentos deve dar um impulso à compra de bens de capital, não necessariamente nacionais. Mas os ganhos com o fim do ICMS em cascata e sobre energia elétrica ajudam o produtor nacional.
Reduzir imposto é bom, mas tem um custo. O projeto embute uma grande aposta, principalmente por parte dos Estados: a de que o aumento da produção induzido por ele gerará mais receita adicional do que a que será perdida pela isenção.
A compensação federal será um seguro de receita. Não é um direito automático, mas um teto para a compensação. Kandir acha que as perdas não vão atingir o teto de R$ 3,6 bilhões para o primeiro ano e R$ 4,4 bilhões para o segundo.
Os Estados cruzam os dedos. Clóvis Panzarini, coordenador da Administração Tributária do Estado de São Paulo, diz que os paulistas são os maiores apostadores. Se a receita adicional não compensar as perdas com as isenções, passados os dois primeiros anos, o buraco poderá ficar em R$ 1,5 bilhão ao ano, diz Panzarini. "Em 12 anos, São Paulo estaria perdendo um Banespa", compara.
Exatamente pelo tamanho da mudança e a complexidade dos interesses políticos regionais envolvidos, a rapidez da aprovação do projeto na Câmara surpreendeu o próprio Kandir e a bancada governista. É uma fatia substancial da reforma tributária, que foi adiada "sine die" exatamente por ser intratável na negociação política.
O projeto diz que o governo federal pagará a compensação aos Estados em títulos que só poderão ser usados para pagar dívidas junto à União. Só o que exceder esta dívida será pago em dinheiro.
Soa drástico, mas não é. Os Estados continuarão pagando apenas na forma e na proporção já existentes. Em vez de usar dinheiro do ICMS usarão títulos, mas o sacrifício não será maior.
O custo fiscal não é pequeno, mas o projeto é um passo importante para cortar custos de produção e tornar mais racional o sistema tributário. O que ele não faz é gerar um forte impacto a curto prazo sobre a balança comercial, algo que afaste de vez dúvidas sobre as contas externas e a política cambial.

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