São Paulo, quinta-feira, 29 de agosto de 1996
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Figura paterna domina "Intensa Magia"

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Maria Adelaide Amaral é sinônimo de drama familiar, no teatro brasileiro. Alguém poderia dizer melodrama familiar.
Autora de novelas de TV como "Meu Bem, Meu Mal" e "A Próxima Vítima", a escritora domina como poucos a união de filhos problemáticos, pais dominadores, maridos infiéis e bate-bocas.
Em fase autobiográfica, vem ultimamente de falar da mãe, em "Querida Mamãe" e na tradução de "Três Mulheres Altas", e de casais, em "Para Tão Longo Amor" e na tradução (mas não na adaptação, como escrevi outro dia) de "Cenas de um Casamento".
Agora chegou a vez do pai, em "Intensa Magia", em cartaz no teatro Cultura Artística.
É um drama à antiga, de sala de estar, com sofá e cenário tradicionais como a peça. Lembra o realismo anos 40 e 50, no teatro americano, de personagens neurotizados -mas aqui sempre desistindo a um passo da tragédia, ao contrário dos modelos Tennessee Williams e Eugene O'Neill.
Antes de desistir, como acontece em quase todas as suas peças, Maria Adelaide Amaral dá oportunidade a interpretações grandiosas.
Em "Intensa Magia", o agraciado é Mauro Mendonça. Ele é Alberto, o pai agressivo, verborrágico, que confunde tendências libertárias e anarquistas com uma insensível falta de carinho pelos filhos, mais até, com crueldade; apresenta-se aí já o melodrama.
(Melodrama que é exposto pelo próprio texto, quando reclamam dele, Alberto, "nem nas novelas de antigamente tinha um homem tão desalmado como você".)
Ele humilha os filhos, por exemplo, dizendo repetidamente que uma das filhas é feia e não consegue marido, e sobretudo a mulher, detalhando os casos de infidelidade publicamente e também repetidamente. Chega a tratar a mulher, interpretada por Rosamaria Murtinho, como "um ser inexistente".
O acinte, a provocação doentia causa uma opressão quase insuportável na platéia.
Mas não se trata de uma tragédia. Maria Adelaide carrega a peça de piadinhas e, para acabar, elimina a catarse com a punição moralista do pai e um final quase feliz -certamente um final que devolve segurança ao público. É a desistência, a um passo da tragédia.
Mas, antes de desistir, ou mesmo nas suas passagens de humor, nas piadinhas, "Intensa Magia" torna possíveis interpretações memoráveis. Uma em particular, como se disse, de Mauro Mendonça.
Seja quando a monstruosidade do personagem atinge traços de caricatura (ele esconde o uísque para não dar ao futuro genro), seja quando atinge traços de perfeição ("se você fosse menos poeta", diz a mulher, derrotada), Mauro Mendonça é brilhante.
Engraçado, genial, ele se funde inteiramente a Alberto, em reunião incomum de atuação apaixonada e técnica -no caso, indistintas. Infelizmente, não é seguido pelo restante do elenco.
Rosamaria Murtinho está longe de criar empatia para seu personagem, a mulher e mãe, o mais dotado para tanto.
Nina de Pádua faz pouco mais do que contemplar o que acontece em cena, com intervenções frias, postiças. O mesmo vale para Rodrigo Mendonça. Thereza Piffer, a outra filha, experiente em dramas familiares, chora boa parte do tempo -e se ressente de um personagem mais desenvolvido.

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