São Paulo, domingo, 1 de setembro de 1996
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Tom Cruise

O salva-vidas
POR ANA VINHAS

ANA VINHAS
FOTO ANNIE LEIBOVITZ

O ator conta em entrevista que quer vir ao Brasil com a mulher, Nicole Kidman, e por que socorre muitas pessoas
Aos 34 anos, o ator Tom Cruise vive a sua melhor performance no papel de bom moço.
Depois de debutar com sucesso na produção de "Missão Impossível" e aparecer como herói socorrendo pessoas em acidentes, ele foi escolhido para coestrelar com sua mulher, a atriz Nicole Kidman, um dos filmes mais aguardados dos últimos tempos.
"Eyes Wide Shut" (Olhos Tampados), que marca a volta do diretor Stanley Kubrick às telas após dez anos de jejum, começou a ser rodado há três semanas em Londres. O projeto vem sendo mantido em segredo absoluto.
"O que posso contar é que é um thriller moderno sobre obsessão sexual e ciúmes", disse o ator, que não trabalhava junto com sua mulher desde "Um Sonho Distante", de 1992. O outro filme que eles fizeram juntos foi "Dias de Trovão", em 1990, que acabou no casamento.
Com 13 anos de carreira e 18 filmes já exibidos, Cruise já passou pelas mãos de diretores como Martin Scorsese e Francis Ford Coppola e atraiu mais de US$ 2 bilhões para a indústria do cinema.
"É um profissional consumado", define Paula Wagner, 48, sua agente e sócia na Cruise Wagner Productions.
Dono de uma imagem impecável, Cruise nunca apareceu como rebelde. "Ser marido e pai é o papel mais importante da minha vida. Sem a minha família, meu trabalho não teria sentido."
Ele diz que nunca ficou longe da mulher por mais de duas semanas. Tem também feito questão de manter por perto os filhos adotivos Isabella, 3, e Connor, 1, mesmo nos "sets" de filmagem.
Antes de a família se reunir em Londres, eles estavam em projetos diferentes. Cruise fez pela primeira vez um personagem mais velho na comédia romântica "Jerry Maguire", de Cameron Crowe, que ainda está em fase de montagem.
Kidman encarnou a heroína Isabel Archer, de "Portrait of a Lady" (Retrato de Uma Senhora), adaptação do romance do escritor Henry James, dirigido por Jane Campion.
No intervalo de suas filmagens de "Eyes Wide Shut", em Londres, Tom Cruise falou à Revista da Folha, com exclusividade, por telefone.
O pedido da entrevista havia sido feito informalmente pela brasileira Heloisa Vinhas, em junho deste ano, no seu primeiro encontro com Cruise depois de ter sido salva por ele em maio, quando foi atropelada na Califórnia.
Heloisa foi convidada pelo ator a assistir às filmagens de "Jerry Maguire". "Disse que tinha uma irmã jornalista e pedi uma entrevista. Ele concordou, mas achei que era brincadeira, que ele tinha apenas sido educado", disse Heloisa.
Mas mais uma vez Tom Cruise assumiu o papel do bom-moço. Sem faltar à sua promessa, um mês depois do encontro com Heloisa, entrou em contato com a Folha, por meio de sua irmã e assessora de imprensa, cobrando um horário para realizar a entrevista. Leia a seguir os principais trechos.

Como estão as filmagens de "Eyes Wide Shut"?
Já estamos há três semanas em fase de pré-produção. Eu, como ator, estou curtindo muito trabalhar com Stanley Kubrick.
Como é trabalhar com ele?
Vou te contar uma coisa... Sabe, eu não estou autorizado a discutir este projeto.
Por que não?
Stanley prefere que eu não torne a coisa pública por enquanto.
Este é o terceiro filme com sua mulher, não é?
Estamos muito animados com o projeto. É um filme sobre obsessão sexual e ciúmes. Um thriller moderno sobre obsessão sexual e ciúmes.
E você é ciumento?
(Risos) Minha única obsessão é querer ficar sempre perto da minha mulher. Nós nunca ficamos separados por mais de duas semanas. Quando estamos filmando em lugares diferentes, eu vou onde ela está. Ou ela vai onde estou.
Você acaba de filmar a comédia romântica "Jerry Maguire". Como você se sentiu interpretando um homem mais velho?
Eu gostei. O personagem, um agente esportivo, tem 35 anos. O filme é uma viagem emocional e uma história de amor. Fazia tempo que eu não lia um roteiro tão legal.
Você tem medo de envelhecer?
Espero viver muito tempo. Há grandes papéis para os atores mais velhos no cinema.
Seu trabalho de produtor em "Missão Impossível" foi muito elogiado. Como você se sente sendo o patrão?
(Risos) Eu gostei. Eu realmente curti produzir esse filme, especialmente o fato de poder trabalhar com Brian de Palma. E foi superemocionante para mim. É como se eu fosse uma criança realizando um sonho.
Você e o Brian de Palma chegaram a se desentender durante as filmagens?
Havia muita pressão e algumas discussões. Mas ele tem um excelente senso de humor e isso tornou nosso trabalho delicioso. Nos divertimos muito juntos. Ainda ontem eu conversei com ele. Ele me faz dar risada o tempo todo. Aprendi muito com ele.
Por que você decidiu se tornar produtor?
Sempre quis fundar minha própria empresa de produção, desde que era jovem. Achei que agora já estava habilitado para isso, que já tinha trabalhado em um número suficiente de filmes e já sabia o suficiente sobre cinema para dar o passo em direção à etapa seguinte, que era a de produzir.
O orçamento chegou a US$ 64 milhões. Você está satisfeito com seu investimento?
Tivemos um retorno financeiro muito bom, mas sobretudo estou muito orgulhoso do filme, com o que conseguimos fazer, com o que Brian de Palma, especificamente, realizou.
O que foi mais difícil em "Missão Impossível"?
Foi o maior filme que já fiz. Havia muitos elementos pelos quais eu fui responsável, junto com minha sócia Paula Wagner. Do ponto de vista da produção, a sequência de cenas do trem foi a mais difícil. Numa parte do filme há um trem TGV (Trem de Alta Velocidade, francês), e, em dado momento, a companhia de trens decidiu tirar o seu time do filme. Depois, voltou atrás e concordou em fazer. Então, foi muito difícil programar tudo.
Você também pensa em dirigir algum filme?
Talvez um dia. Se eu conseguir encontrar o roteiro e o assunto adequado, quem sabe?
Qual é seu próximo projeto?
Estou produzindo um filme chamado "Pre". É baseado em um corredor famoso chamado Steve Prefontaine. Não vou fazer nenhum papel nele, só a produção. Estamos trabalhando com o roteirista Robert Towne.
Você tem socorrido muita gente. Como você explica esses acontecimentos em sua vida?
Sempre tive essa coisa de ajudar as pessoas. Um dos aspectos legais de ser produtor é que tenho a oportunidade de ajudar pessoas. Eu nunca me esquecerei o quanto me assustei com a brasileira Heloisa. Ela estava lá, na rua. Foi muito chocante, e eu fiquei preocupado com ela, só isso. Eu me importo com as pessoas, simplesmente isso. Minha filosofia é que estamos todos juntos nesse barco e precisamos ajudar uns aos outros. Acho que temos que assumir responsabilidade uns pelos outros.
Esta imagem de herói o perturba. Como você lida com ela?
Nunca me preocupei com essa coisa de imagem. A imagem é criada pelos outros. Eu vivo a minha vida do jeito que acho melhor. É importante tratar os outros da maneira como eu gosto de ser tratado. Deve-se respeitar as pessoas e ter suficiente respeito por si próprio.
O seu trabalho já atraiu US$ 2 bilhões para a indústria cinematográfica. O que o dinheiro realmente significa para você?
Dinheiro significa apenas segurança financeira e a capacidade de ajudar minha família e outras pessoas e dar segurança financeira a elas. É tão simples assim.
Como você definiria a fase atual do cinema nos Estados Unidos?
Há muito mais oportunidade para cineastas de vanguarda ou independentes e também para quem faz filmes comerciais. O mercado, como um todo, se ampliou. O mundo está ficando essencialmente cada vez menor com as novas redes de comunicação, agora que temos Internet, CNN. Os estúdios se conscientizaram que o mercado se globalizou. Novos mercados se abriram, há mais dinheiro, e, com isso, os estúdios estão mais dispostos a arriscar com projetos menores. Veja o caso da Miramax, da New Line, das companhias independentes que permitem a realização de filmes de muitos tipos.
Qual é o papel do cinema na virada do século?
Acredito que os filmes têm o poder de mudar o mundo. Veja um filme como "A lista de Schindler". Cada vez que um filme como este é visto, ele muda não só a cultura popular, mas também a subcultura. Bate em nossas almas, nos nossos códigos morais, questiona nossas vidas. Então acho que o cinema terá um papel tão importante quanto teve nos últimos 30, 40 ou mesmo 60 anos. O cinema vai desempenhar um papel da maior importância no próximo milênio.
O que significa para você ser pai?
Para mim, ser marido e pai é o papel mais importante da minha vida. Porque minha família é a coisa mais importante. Sem ela meu trabalho não seria nada, meus dias não teriam sentido.
Você tem dois filhos adotivos e planeja ter seus próprios filhos?
Eles já são meus próprios filhos. Mas vamos ter muitos filhos. Quantos, ainda vamos ter que pensar.
Você já esteve no Brasil?
Sim, em 1987 (na Amazônia). Achei um país incrível, lindíssimo, gostaria de voltar. Mas agora preciso acabar o novo projeto. Vai levar uns nove meses. Depois vou ver o que faço, mas minha mulher e eu adoramos viajar, e o Brasil é um dos lugares para onde gostaríamos de ir juntos.
Você teve algum contato com o cinema brasileiro?
Assisti... Eu sempre assisto filmes de todas as épocas e de todos os países.

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