São Paulo, terça-feira, 3 de setembro de 1996
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Suter une corpo e geografia

PAULO VIEIRA
EDITOR-ADJUNTO DA ILUSTRADA

O argentino radicado no México Gerardo Suter, 39, chega dia 11 a São Paulo para conhecer o espaço a que terá direito na 23ª Bienal Internacional. Único representante mexicano no evento, Gerardo é economista de formação, fotógrafo autodidata e artista plástico tardio.
Seu trabalho fotográfico, sempre em preto-e-branco, explora o corpo humano, à maneira do baiano Mário Cravo Neto, um dos brasileiros que conhece.
Nos últimos anos, Suter adicionou novas técnicas a seu trabalho. Passou da fotografia à utilização do espaço tridimensional e, mais tarde, o vídeo.
Para a Bienal, prepara trabalho inédito -uma instalação com fotografias e vídeo, sempre tendo como suporte e ponto central de interesse o corpo humano.
Suter falou com exclusividade ontem à Folha de sua casa em Cuernavaca, cidade a 40 minutos da capital mexicana.
Folha - Como será sua sala na Bienal?
Gerardo Suter - Será um espaço escuro de 6x4 metros em que exibirei uma enorme foto e outras seis menores. Também estarei projetando um vídeo. São imagens do corpo humano fundidas com cartografia, mapas físicos.
No vídeo, os sons são também próprios do corpo humano, da respiração, dos batimentos cardíacos. Não há uma analogia direta entre partes do corpo e a divisão política do mundo. Acho que assim atendo à proposta da Bienal, a desmaterialização da arte.
Folha - Por que o interesse no corpo humano?
Suter - Acho que isso vem das influências das culturas pré-hispânicas do México. O corpo é o espaço de contato por excelência com o cosmo. Não em uma dimensão religiosa, mas certamente mística.
Folha - O sr. utilizava-se de um personagem, o Professor Retus -um anagrama de seu sobrenome-, em seus trabalhos. O que aconteceu com ele?
Suter - Ele se perdeu em algum lugar da selva de Chiapas, que é uma província de grande energia. Retus é meu alter ego. Eu nunca assinei exposições com esse nome. Na realidade, roubava as imagens que Retus criava. Não matei o personagem, ele apenas está perdido e pode reaparecer.
Folha - Como o sr. vê o exército zapatista e a insurreição de Chiapas?
Suter - É, sem dúvida, o maior acontecimento da história recente do México. O zapatismo abriu um enorme espaço político para a democracia e para a participação popular. Não vejo conexões diretas entre meu trabalho e o zapatismo, a não ser metaforicamente. Posso dizer que a busca do alargamento de espaços, que é uma meta dos zapatistas, é também a minha busca.
Folha - Como economista, como viu a crise econômica que se abateu sobre o México em 1995?
Suter - Para mim, como acho que para 99,9% dos mexicanos, foi uma grande surpresa. Não concordava com o consumo indiscriminado que fazíamos de produtos americanos, que realmente ficaram mais baratos que os nossos.
Os mexicanos estavam comendo "corn-flakes" importados no café da manhã, um produto que nós produzimos. Agora vamos viver um período certamente muito longo para reconstruir nossa base industrial, que foi destruída.
Folha - O sr. chegou a flertar com a cor e a ausência do corpo humano em uma de suas exposições...
Suter - Foi na exposição "Cantos Rituales", que realizei em 1994. De fato, era um período de transição, que depois abandonei. A fotografia colorida não permite a dramaticidade que obtenho com o preto-e-branco.
Também, pela primeira vez naquela ocasião, apresentei alguns objetos. Era, de alguma forma, um caminho para a tridimensionalidade, que agora está presente também com a videoinstalação.
Folha - O sr. conhece artistas brasileiros?
Suter - Acho que o Brasil tem a produção mais importante da América Latina. Há muitos artistas interessantes, como Mário Cravo Neto, com quem expus coletivamente na Colômbia e com quem vejo muitas relações. Também gosto de Rosângela Rennó. Há muitos outros artistas, mas não sou bom para nomes.
Folha - Onde é Cuernavaca?
Suter - É a cidade onde decidi criar meus filhos. É um lugar a 40 minutos da Cidade do México, que é muito poluída. Saí da grande cidade sem cortar minha relação com ela, pois continuo bastante próximo.

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