São Paulo, sexta-feira, 13 de setembro de 1996
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Gol da República Federativa do Brasil

JOSÉ SARNEY

O mestre Darcy Ribeiro fez-me uma carta pedindo que com ele apresentasse uma emenda para retirar do nome do Brasil o penduricalho que lhe colocaram de "República Federativa", apelido dado pela Constituição outorgada durante o regime militar e mantido pela nossa gloriosa, de saudosa memória, Constituinte de 88, que fez a Constituição cidadã, a do Brasil ingovernável.
Atendi ao pedido do professor Darcy Ribeiro, este homem excepcional, cujo exemplo de vida é uma lição de santidade. Ele, que se diz tão carregado de pecados, sobretudo aqueles sobre os quais são Paulo (é bom lembrar, o apóstolo) tanto predicou contra, o diabo da carne. O nome de um país, do lado constitucional, é matéria tormentosa.
Quando do esplendor do sistema comunista, países que não tinham partidos, nem liberdade, nem respeitavam os direitos humanos colocavam: República Democrática da Alemanha, República Democrática da Hungria... De democrática, nada. Era artifício para uso externo.
O Brasil já foi Terra de Santa Cruz; Império do Brasil; na Constituição de 1891, Estados Unidos do Brasil; na de 1934, República dos Estados Unidos do Brasil; na de 37, volta a ser Estados Unidos do Brasil, que permanece em 46 e 67. A grande bobagem foi a de 1969. Colocou 'República', forma de governo, e 'Federativa', que se opõe a 'União'.
Se quisessem colocar todos os atributos políticos, o título deveria ser: "Constituição Democrática da República Federativa Presidencialista da União dos Estados e dos Municípios do Brasil", o que entraria no Festival de Besteiras do Ponte Preta.
O que se viu? O Sarney e o Darcy querem mudar o nome do Brasil -foi o que falaram. Ao contrário, nós queremos é retirar a mudança que fizeram do nome do Brasil. Queremos Brasil, só Brasil, como deve ser.
Estamos preocupados com todos e tantos problemas do Brasil, mas isso não exclui que nos preocupemos com o nome do nosso país. Brasil, só Brasil, é a demonstração mundial de que passamos por todas as nossas agruras da primeira infância e, agora, não precisamos de penduricalhos. Não precisamos anunciar que não somos ditadura nem império ou reino.
Nas Nações Unidas, a sua Carta não permite esses carimbos que são colocados, muitas vezes para simular. Cada país é chamado pelo seu nome. Até os Estados Unidos da América tiveram de retirar o América para ficar só Estados Unidos. Lá, Brasil é Brazil, com z.
Diz-se, também, que vai custar caro. Teremos de mudar todos os papéis. Essa mudança pode ser gradual e não é muita. As nossas cédulas não têm República Federativa e raro é o papel público que registra essa qualificação.
Eu nunca ouvi locutor nenhum gritar: "Gol da República Federativa do Brasil". Sempre gol do Brasil.

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