São Paulo, domingo, 22 de setembro de 1996
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No vale-tudo eleitoral, candidatos transformam São Paulo em 'sertão'

XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

O sertão é aqui. Os métodos e o folclore utilizados por candidatos na periferia de São Paulo, tida como a cidade mais moderna do país, repetem os costumes dos grotões do Norte e Nordeste.
Nos arredores da capital, troca-se voto por remédios, leite, exames ginecológicos, dentadura, tijolo etc. Ou simplesmente por promessas de todas as naturezas: terrenos, casas etc.
A gastronomia também é a mesma das campanhas sertanejas: a buchada de bode, o mais cobiçado prato do interior do Nordeste, reina no cardápio dos subúrbios e arrabaldes paulistanos.
A buchada é preparada com a utilização de vísceras de bode ou carneiro. Os ingredientes são colocados dentro de espécies de bolsas, feitas do bucho do caprino.
É comum, em algumas regiões do Nordeste, servir-se o prato acompanhado de muita carne e também da cabeça do animal.
"Sem forró e a sustância da buchada, o eleitor desanima", diz o alagoano José de Barros Lima, o Zé Lagoa (PDT), um dos mais folclóricos candidatos a vereador (ver reportagem à página 1-18).
Lucro eleitoral
O baiano Luiz Francelino Lima, 40, há 25 anos em São Paulo, é conhecido na zona leste por preparar bons pratos nordestinos que animam a campanha na sua região.
Cozinheiro e sócio do Cantinho do Norte, um boteco em Itaquera, Lima vê o seu lucro crescer em ano eleitoral.
Ele funciona informalmente como "cabo eleitoral" do candidato Vicente Viscome (PPB) e até cedeu um espaço ao lado do seu balcão para o político realizar "festinhas" para os eleitores.
O pintor de paredes José Honório Ferreira, 38, cearense de Iguatu, orgulha-se de ter Viscome como candidato."Ele promove umas farras para animar a gente", conta o eleitor.
Leite em pó
Na mesma região da cidade, o concorrente de Viscome, Zé Índio (PPB), candidato à reeleição, já distribuiu leite em pó em seu comitê no bairro da Mooca.
Os assessores do vereador alegam que Índio faz esse trabalho há muito tempo e não somente em período eleitoral.
Eleitor de resultados
Assim como nas regiões mais pobres do país, nos grotões paulistanos existe uma espécie de eleitor de resultados.
É aquele que sai coletando ou perseguindo qualquer oferta ou promessa dos candidatos.
"Eu pego o que tiver", diz Maria Auxiliadora de Souza, 32, paulistana, dona-de-casa, moradora de um barraco no Córrego Pirajuçara (zona oeste da cidade). "Quando não tem nada, eu me inscrevo em qualquer lista de promessa."
Ela conta que se cadastrou para receber uma casa ou apartamento do projeto Cingapura. Fez a inscrição em um dos comitês do candidato Baptista de Oliveira (PPB), no Butantã (zona oeste).
Na sua busca por ofertas eleitorais, Auxiliadora utiliza também seus dois filhos menores, que peregrinam pelos comitês.

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