São Paulo, segunda-feira, 6 de janeiro de 1997
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Vidal avalia a nova era da seleção

"Futuro é nebuloso", afirma

EDGARD ALVES
ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ DO SUL

O técnico Ary Vidal vai formar a seleção nacional masculina com base na observação dos jogadores durante o Campeonato Brasileiro de basquete, que está em andamento.
Sem o cestinha Oscar Schmidt, que fez sua despedida na Olimpíada de Atlanta e foi a principal arma da equipe nos últimos 15 anos, a seleção inicia um novo ciclo.
Começa pela Copa América, em agosto, torneio que apontará três times para o Mundial-98.
Vidal, que dirige o Corinthians-Pony, de Santa Cruz do Sul (RS), diz que o futuro da seleção é "nebuloso" porque o Brasil não manteve o padrão internacional.

Folha - O Brasil continua no grupo de ponta do basquete mundial?
Vidal - Estou de acordo com declaração do Marcel (ex-jogador e atual técnico do Guarulhos), apontando que, tecnicamente, os atletas são bons, mas não acompanham o nível internacional.
Na seleção, com dois meses de treino, o técnico não conseguirá fazer milagre.
Folha - Como fica a seleção após o sexto lugar na Olimpíada?
Vidal - Vai mudar com a saída do Oscar, a principal estrela. Alguns atletas independem do Campeonato Brasileiro, mas esse torneio é que vai dar o tom da convocação para a Copa América, que classifica para o Mundial.
São três vagas, e tem Argentina, Venezuela, Porto Rico, Canadá, República Dominicana e Cuba.
Folha - O Mundial-94 (11º lugar, pior posição do Brasil na história) mostrou o que vem pela frente?
Vidal - O ruim foi a forma apática como o time se portou. Mas deu uma idéia de como as coisas serão difíceis, um futuro nebuloso. No Pré-Olímpico, depois, houve uma superação, mas foi um sufoco.
Folha - A campanha olímpica (6º lugar em Atlanta-96) camuflou um pouco a situação?
Vidal - Pode ter camuflado, pois chegamos na frente da Croácia. Outros fatores, além da técnica e da tática, certamente influíram na campanha.
Folha - Você é fã do Oscar. Aponta outro astro na atualidade?
Vidal - Oscar é exemplo para atleta de qualquer modalidade. Não existe outro igual. O mais habilidoso hoje é o Caio Cassiolato (ala-armador do Report/Mogi), mas está apenas começando.
Folha - Quais os planos para a seleção?
Vidal - A idéia é criar um corpo de técnicos na CBB, influindo desde as categorias menores. O problema é viabilizar verba.
Quem está na seleção, está beneficiado ou prejudicado pelo trabalho desses técnicos nos seus clubes. O sucesso da seleção tem a ver com o trabalho desses técnicos.
Folha - Contra ou a favor dos estrangeiros nos clubes nacionais?
Vidal - Tem vantagens e desvantagens. O espetáculo fica melhor, as equipes melhores, atrai mais público. Em contrapartida, são dois atletas nacionais que não jogam, que deixam de desenvolver a sua potencialidade, e isso reflete na própria seleção.
Folha - Como você analisa o basquete de clubes no Brasil?
Ary Ventura Vidal - Só por ser de clube já não é bom. Veja exemplos de sucesso: na Espanha, só tem dois clubes, o Real e o Barcelona. Nos outros países, são empresas. Aqui, temos ainda a mistura do futebol, que é o carro-chefe.
Folha - É uma concorrência inevitável e forte demais?
Vidal - Sim. Aí entra a questão do clube, que é a parte carente. Até no futebol está se devendo o que não tem. Além disso, não são dirigidos por profissionais do ramo.
Folha - É a causa das distorções?
Vidal - O patrocínio quer retorno, aparecer na mídia, o que ocorre só quando a equipe obtém resultado. Por isso, a verba é toda gasta na contratação do time, surgindo daí as distorções.
As categorias menores, de formação, passam a não ter atenção. O basquete sofre mais: é diferente do vôlei e do futebol, que revelam jogadores nas ruas, na praia.
Folha - Depende de estrutura?
Vidal -É elitista, precisa de clube. Então, aparecem as famosas escolinhas, cobrando taxa suplementar, aumentando a limitação. Outra barreira, também elitista: o atleta precisa ser alto e forte.
Folha - Como amenizar esses problemas?
Vidal - A solução está nas escolas, mas não existe essa preocupação. Na escola tem quadra, mas falta o professor especializado.
Um bom exemplo é o caso do Joaquim Cruz, campeão olímpico dos 800 m. Ele começou jogando basquete com o Luiz Alberto, que era professor de Educação Física, de técnico. Por sorte, Luiz Alberto conhecia atletismo, era o homem certo para descobrir um valor.
Eu sou formado em Educação Física, mas se fosse eu o professor dele, o Cruz jamais teria sido um atleta. Eu não entendo nada de atletismo. Imagine isso em relação ao basquete.
Folha - A Confederação de Basquete pode intervir no processo?
Vidal - Ela deixou de promover as categorias menores nos últimos anos. O custo estava elevado demais. Está voltando agora.
Nossos maiores talentos das últimas décadas vieram de outros Estados. Foram descobertos lá. Só depois foram para São Paulo. Exemplos: Janjão (MT), Pipoka (DF), Rolando (PR), Luiz Felipe (ES), Evandro (RS), Rogério (RS), Oscar (RN), Rato (BA).
Folha -Qual é a relação entre seleção e Campeonato Brasileiro?
Vidal - Os campeonatos espanhol e italiano são espetaculares, mas, no plano internacional, de seleção, aqueles países estão cada vez mais afundados. Parece que é o que está acontecendo no Brasil.

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