São Paulo, segunda-feira, 6 de janeiro de 1997
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Clássicos seduzem os modernos

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

No próximo dia 4 de março, o balé "O Lago dos Cisnes" estará completando 120 anos. Desde sua criação, além das produções que procuram reproduzir o original, este espetáculo vem ganhando versões modernizadas, que procuram conectar seu enredo com a época contemporânea.
Na trilha de "O Lago dos Cisnes", outros balés clássicos -como "Giselle", "O Quebra Nozes" e "Coppelia"- continuam estimulando a imaginação de coreógrafos modernos.
Um dos mais bem-sucedidos é o sueco Mats Ek, do Cullberg Ballet, que já realizou versões elogiadas sobre "O Lago" e "Giselle".
"Adormecidas nos libretos originais dessas fábulas românticas, há inúmeras relações complexas, de ordem social e espiritual, que eu procuro recuperar por meio de meu próprio vocabulário", diz Ek, que deverá realizar temporada no Brasil em 1988, com o Cullberg.
A exemplo de Ek, que trocou o bosque encantado de "Giselle" por um manicômio, também um jovem talento brasileiro -o mineiro Marcelo Gabriel, do grupo Dança Burra- está disposto a transgredir os clássicos.
Em meados deste ano, Gabriel deve estrear "O Anti-Homem", título de sua versão sobre "O Lago dos Cisnes". Procurando romper com regras convencionais em suas coreografias, Gabriel resolveu se inspirar em "O Lago" pelo caráter revolucionário que a obra teve em sua época.
"A história da civilização sempre passa por clássicos como 'O Lago'. Como criador contemporâneo, faço o papel da mediação, transportando uma obra de referência como esta para um universo atual", comenta Gabriel.
Em "O Último Homem", Gabriel pretende "discutir" as questões de espaço da composição coreográfica, tão bem resolvidas na versão original de "O Lago" que tornaram-se padrão para obras posteriores.
Só que, na visão radical de Gabriel, o domínio do espaço pelo bailarino pode ganhar parâmetros inversos. "Vou dançar de olhos vendados, não importa que em alguns momentos eu entre pelas coxias ou caia do palco", diz o coreógrafo, que também é intérprete de seus espetáculos.
"Sinto-me atraído por 'O Lago' porque representa uma estética européia que influenciou muito nossa cultura. Ao mesmo tempo, não quero ser servo do rei, como mero executor dos passos tradicionais da dança clássica. Ao romper com essa tendência viciada, procuro criar contatos com a essência do caráter brasileiro", explica Gabriel.
Prometendo passar a limpo os cânones de "O Lago dos Cisnes", Gabriel trocará a música original de Tchaikovsky por composições feitas por ele mesmo, sendo que uma delas deverá ser interpretada pela cantora lírica Sylvia Klein.
Também o requintado cenário de "O Lago" será eliminado por Gabriel, que pretende usar imagens de vídeo na ambientação de "O Último Homem".
Outro coreógrafo contemporâneo que gosta de revisitar clássicos é o russo Boris Eifman. À frente do St. Petersburg Ballet Theatre, um dos poucos grupos de linguagem moderna da Rússia, Eifman se apresentará no Brasil em junho.
Oposto de Eifman, o Ballet Kirov reviveu no Brasil, em 96, o divertimento que o coreógrafo Marius Petipa imprimiu em 1869 a "Don Quixote", de Cervantes.
Em sua versão, Eifman enfatizou o drama, ao ambientar "Don Quixote" num asilo de alienados mentais. No programa que Petipa mostrará no Brasil, não se sabe se "Don Quixote" estará incluído.
É certa, no entanto, a presença de alguma releitura de obra clássica, já que Eifman também realizou uma versão coreográfica para "Os Irmãos Karamazov", do escritor Fiodor Dostoievsky.

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