São Paulo, segunda-feira, 6 de janeiro de 1997
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O DESAFIO DA PRIVATIZAÇÃO

Nos últimos anos houve críticas à morosidade do processo de privatização brasileiro. Comparado ao ritmo e à intensidade da privatização em outros países da América Latina, como México e Argentina, o Brasil foi sempre o retardatário.
Esse descompasso diante da onda de liberalização na região, claríssimo sobretudo no final dos anos 80, vai sendo aos poucos superado. Aliás, o que era um atraso pode converter-se em vantagem. Afinal, hoje praticamente já não há o que privatizar no México e na Argentina, enquanto o Brasil tem um estoque de patrimônio estatal significativo.
A vantagem, como se sabe, está no fato de que vender ativos muitas vezes é uma forma mais fácil de equilibrar as contas públicas do que aumentar a arrecadação e cortar gastos. Na América Latina, onde a atração de capitais externos tornou-se a peça chave dos modelos de estabilização dos últimos anos, a privatização serve também ao objetivo crucial de atrair capitais externos.
O risco, como aliás o próprio Fundo Monetário Internacional já alertou em estudos sobre o assunto, é a privatização acabar servindo para "tapar os rombos" sem que ocorra um ajuste fiscal duradouro e uma retomada dos investimentos com ajuste das contas externas.
A privatização em 1997 será especialmente importante desse ponto de vista. O desequilíbrio fiscal crônico, o adiamento das reformas do Estado e o déficit comercial crescente afetam a credibilidade na estabilização. Nesse contexto, a aceleração do programa de privatização torna-se a pedra de toque de todo o Plano Real.
Mais importante ainda, entretanto, é escapar à armadilha da queima de ativos para "tapar rombos".
Há boas chances de a privatização brasileira enfrentar esse desafio. Pela sua magnitude e complexidade, envolvendo das telecomunicações ao setor elétrico, passando por transportes, saneamento e sistema financeiro, o processo de privatização pode converter-se numa oportunidade para relançar o investimento e redefinir o padrão de financiamento da economia brasileira.
O que se exige é enorme capacidade de articulação operacional e uma vontade política sem precedentes. O ano de 1997 pode ficar na história como o período em que, com a privatização, a economia brasileira encontrou sua âncora real. Ou, se faltar engenho e arte, será mais um ano em que o governo, com jeitos e casuísmos, correrá atrás do tempo para cobrir os rombos de um Estado falido.

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