São Paulo, quarta-feira, 8 de janeiro de 1997
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Rock'n'roll busca alternativas à crise

CAMILO ROCHA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Qual é o futuro do rock? O gênero, que já passou das quatro décadas de vida, está atravessando algumas crises. Uma delas é existencial, de identidade. O rock, que gosta de se imaginar como rebelde, virou parte integrante do "sistema". Rock'n'roll virou a Coca-Cola da música.
Mas a pior delas é criativa: todas as suas notas já foram tocadas, todos os acordes já foram reciclados e todas as variações da equação guitarra-baixo-bateria já foram tentadas.
É claro que o rock continua vendendo como nunca. O problema é o que está vendendo no rock. Os grandes nomes de hoje do gênero não passam de repetidores de fórmulas musicais comprovadas e propagadores de uma estética normalzinha e careta. Que emoção oferecem Bush, Oasis, Hootie & The Blowfish e Alanis Morissette?
Onde está a salvação? É bem mais embaixo, nas diversas correntes que vêm borbulhando no último ano sob a avalanche de mediocridade comercial despejada pela MTV e pelas FMs.
São artistas de rock que prezam a inovação, que gostam de oferecer um desafio em vez de meramente entretê-lo. Como? Soando cada vez menos rock, se libertando das suas barreiras restritivas.
São grupos como Girls against Boys, Stereolab, Soul Coughing, Cibo Matto, Cornershop e Garbage, que extrapolaram as referências usuais do rock para fazer música inspiradíssima.
Ou então os apóstolos do chamado pós-rock, bandas como Tortoise e Paw. E ainda, no topo de um pedestal, o homem que mais (e melhor) injetou energia renovada no rock em 96, Beck.
Nesse meio tempo, Smashing Pumpkins, U2 e Blur prometem trazer em seus novos discos sonoridades afastadas do formato tradicional do rock.
A coletânea "Altered States", lançada na Inglaterra há pouco tempo, é emblemática dessas novas correntes e animadora pelas alternativas musicais que apresenta.
Contendo dois CDs, traz artistas do britpop remixados, thrash metal vertido em jungle, bandas de trip hop com guitarras, nomes que cruzam rock com eletrônica.
Seu subtítulo é "Distorted Dance & Remix Rock", o que já explica muita coisa. O disco oferece um amplo painel de possibilidades para o combalido rock'n'roll, possibilidades que têm em comum uma característica: o uso e abuso da eletrônica.
Só os mais tacanhos ainda não perceberam que a eletrônica é a última chance de a rebeldia existir dentro do rock.
A revista norte-americana "Spin" recentemente publicou uma extensa matéria apontando a música eletrônica como a próximo explosão a vir do underground nos Estados Unidos.
Num lugar onde rock alternativo virou produto de linha de montagem das paradas de sucesso, nomes como Rabitt in the Moon, Orbital, Chemical Brothers e Aphex Twin trazem som e atitude realmente novos. E que não dá para tocar na FM.
Modismo e substância
Na Inglaterra, afetada muito mais profundamente pela cultura das raves e do tecno, muitos já perceberam isso faz tempo. Afinal, foi lá que se deu o fenômeno do indie-dance, por volta de 89/90, com bandas como Happy Mondays, Stone Roses e Primal Scream.
Mas enquanto o indie-dance tinha uma certa aura de modismo (o que deu em muitos grupos como Soup Dragons, que entraram na onda mais por motivos comerciais do que artísticos), os cruzamentos de hoje têm muito mais substância e parecem surgir de uma verdadeira vontade de experimentar.
A prova é que há um distanciamento dos padrões com uma música pop assimilável com refrões, melodia e muitas vezes até vocais.
Então o que vai ser? A vasta e excitante quantidade de opções pipocando fora das paradas de sucesso ou mais uma melodia dos Beatles reembalada?
Se o rock ainda quer ser um estilo que importa, e não um gênero em formol como o jazz ou o blues, é bom que fique com a primeira opção.

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